I.
Introdução
Os
ritos têm na Maçonaria, enquanto organização e prática simbólica, um papel
central. Constituem formalismos, representações particulares em Maçonaria
cujo carácter e natureza se distingue do carácter de outros ritos pela forma,
mas também pelo espírito que os impulsiona e inspira.
O
rito é a acção do mito, ou seja, o mito fornece o arquétipo, o modelo
exemplar para a acção do homem, o qual, para ter significado, deverá ser a
repetição de uma conduta divina. O mito concretiza-se e actualiza-se em ritos.
O rito será assim o conjunto de práticas religiosas, cumpridas segundo uma
ordem estabelecida, as quais, permitindo recuar aos primórdios, ao tempo das
origens, dão ao homem uma espécie de poder mágico-religioso, sobre aquilo que
o cerca[i].
Então
o rito realiza o mito e permite a sua vivência e memória. Separado do rito, o
mito perde, se não a sua razão de ser, pelo menos o melhor da sua força de
exaltação: a capacidade de ser vivido e repetido.
O
rito tem uma inspiração litúrgica[ii]
existindo vários dentro da tradição maçónica e com alterações de país
para país. Os mais praticados na tradição continental europeia são o
R.E.A.A. [Rito Escocês Antigo e Aceite], o R.E.R. [Rito Escocês Rectificado] e
o Rito de Emulação [RdE].
Mas
ao contrário da liturgia própria das religiões, entendida como conjunto
das cerimónias e orações determinadas pela autoridade competente para cada
acto do culto oficial, o rito maçónico tem reflectido o carácter areligioso
da própria organização maçónica, a ausência de uma hierarquização
vertical própria das confissões religiosas e a recusa das autoridades maçónicas
em transformar as regras da Arte Real em dogmas inquestionáveis e intocáveis,
presos a uma autoridade inconformável.
Este
texto tem por objectivo fazer uma pequena viagem adentro da ritualistica maçónica
e mostrar aos neófitos ou aos meros curiosos porque é que a Maçonaria não é
uma igreja, ou confissão religiosa e, portanto, não é uma ameaça às ordens
religiosas estabelecidas. Não dá sacramentos, não faz noviços, não
pastoreia almas, limita-se a passar aos homens livres, honrados e de bom reporte
social regras de conduta e de elevação moral que têm origem em tempos
imemoriais, mas que a relativização dos valores e o multiculturalismo dos
tempos que vivemos tornou raros.
II.
Ritos e Cristianismo
A
franco-maçonaria simbólica regular pratica os três graus tradicionais da maçonaria
operativa: aprendiz, companheiro e mestre. Respeita e aplica os landmarks,
regras antigas e fundacionais da fraternidade maçónica. Entre estas regras
conta-se a crença num Deus ou entidade superior denominado Grande Arquitecto do
Universo [GADU], a crença na sua Vontade Revelada expressa num Livro da Lei
Sagrada [no inglês Volume of Sacred Law] e a tomada das obrigações ou
juramentos sobre esse livro de particular escolha do promitente.
De
certa maneira, o simbolismo maçónico é desde logo inspirado por uma
simbologia de natureza esotérica que remonta à tradição judaico-cristã. Não
se esgota nela mas parte dela e segundo alguns autores mergulha mais além. As
lojas dos três primeiros graus [lojas simbólicas] designam-se Lojas de S. João,
querendo significar que são a replicação dos ensinamentos de S. João
Evangelista e de S. João Baptista, os dois santos patronos da maçonaria.
O
Livro das Constituições do pastor Anderson de 1723 dispunha a esse propósito:
“antigamente os irmãos reuniam-se no dia de S. João, ao nascer do Sol, num
convento ou numa alta montanha da vizinhança e depois de aí elegerem os
grandes oficiais dirigiam-se ao local da festa”[iii].
Essa festa costuma ter lugar no dia 24 de Junho e é ritualmente celebrada pela
fraternidade maçónica, por todo o mundo.
De
acordo com o Livro de Lucas do Novo Testamento, S. João Baptista seria familiar
de Jesus Cristo, tendo nascido seis meses antes e sido baptizado por ele. S. João
Baptista destacou-se pela sua prática religiosa, orando e baptizando judeus no
rio Jordão.
De
acordo com as Escrituras Canónicas esse ministério seria interrompido quando
Herodes Antipas o aprisionou por ter publicamente condenado o seu casamento com
Herodias, sua cunhada (Lucas 3:19)[iv].
De acordo com a narrativa, embora Herodes respeitasse a autoridade de S. João
Baptista entre os judeus não resistira ao pedido de Salomé, sua filha, de
ver-lhe oferecida a cabeça decepada de S. João Baptista.
A reprovação do vício, enquanto expressão de baixeza moral, é assim
incorporada como um dos ensinamentos basilares da Ordem de que um maçom digno
– tal como S. João Baptista – preferirá ver a sua cabeça decepada do que
trair os ensinamentos da sua Ordem.
S.
João Evangelista seria discípulo de S. João Baptista, tornando-se mais tarde
num dos Doze Discípulos de Cristo. É venerado como santo dentro da Cristandade,
comemorando-o a Igreja Católica a 27 de Dezembro e a Igreja Ortodoxa a 26 de
Setembro. De acordo com os evangelhos canónicos[v]
foi o único apóstolo que acompanhou Jesus até à morte na cruz sendo-lhe
confiada a tarefa de cuidar de Maria, mãe de Jesus. Presenciou com Pedro e André
a
ressurreição da filha de Jairo, a transfiguração de Jesus na montanha e sua
angústia no Getsêmani. Após as perseguições sofridas pelos cristãos em
Jerusalém, transferiu-se com Pedro para a Samaria, onde desenvolveu uma intensa
evangelização. Mudou-se para Éfeso onde
viveu o resto de sua vida, morreu e foi sepultado. Ali
terá escrito o Quarto Evangelho, o último dos evangelhos canónicos, e
as Epístolas.
O
seu evangelho difere dos outros três por se deter no aspecto espiritual dos
ensinamentos de Jesus, isto é, a vida e a obra do Mestre com base no mistério
da encarnação. Como homem da elevação espiritual, mais inclinado à
contemplação do que à acção inspira a acção maçónica de desbaste da
pedra bruta e é essa provavelmente a razão da sua adopção como patrono da maçonaria.
Tal
como a própria doutrina da maçonaria os textos canónicos atribuídos a João
Evangelista são o repositório de uma longa evolução espiritualista que
ordena os contributos gregos, egípcios, judaicos e orientais de que a maçonaria
é particularmente ciente. Exprimem, lembra Paul Naudon, “a resposta imutável
à eterna dúvida metafísica do homem, fazendo compreender da melhor forma o
fundo comum e tradicional de todas as religiões” [vi].
Nesse
aspecto, a maçonaria integra-se numa tradição milenar que ancora nos Mistérios
de Eleusis e Egípcios. A finalidade espiritual destes era preparar a vinda da
perfeição. Fazer-se passar por uma Iniciação significava morrer
simbolicamente para a vida material e desprovida de referências e subir ao
estado de pureza, do conhecimento e da plenitude. O iniciado que parecia
conservar o mesmo corpo e a mesma alma recebia em cada grau iniciático uma
regeneração de uma parte do seu ser, ao receber a iluminação. Relata o Evangelho
de S. João [3: 4 a 7][vii]:
[...]
(4) Disse-lhe Nicodemos: Como pode um homem nascer, sendo velho? Pode,
porventura, tornar a entrar no ventre de sua mãe, e nascer?
(5)
Jesus respondeu: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer da
água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus.
(6)
O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito.
(7)
Não te maravilhes de te ter dito: Necessário vos é nascer de novo.[...]
Nascer
da água para o espírito, suportando as provas do vento e do fogo, por aí se
faz o recipiendário na sua árdua progressão para a Luz. Uma luz lhe é
efemeramente mostrada para que dela se aperceba sem que a possa tomar para si.
Porque o absoluto é um instante que se afasta à medida que nos acercamos dele.
Tentamo-lo mas nunca é nosso.
III.
REAA
Os
historiadores Christopher Knight e Robert Lomas[viii]
atribuem a formação do Rito Escocês Antigo e Aceite ao facto da Grande Loja
Unida de Inglaterra [GLUI] se recusar a reconhecer os altos graus da maçonaria
regular levando à formação em 1819 de um Supremo Conselho para Inglaterra dos
graus do Rito Escocês.
Mas
as primeiras referências a estes graus são anteriores, oriundos de França,
datando do período entre 1715 e 1745. Na verdade, é em França que se
encontram as primeiras referências ao termo escocês, através da palavra «ecossais».
No final do séc. XVII, as ilhas britânicas haviam sido atingidas por um surto
de tifo, tendo muitos escoceses fugido para França, onde terão cultivado os
seus interesses maçónicos. Knight e Lomas atribuem esse facto a razões menos
prosaicas e à luta pela sucessão dinástica em Inglaterra. Os altos graus
foram associados ao Cavaleiro Ramsey nascido em Ayr em 1686, o qual terá
promovido a criação destes graus em França quando era tutor dos dois filhos
de Jaime VIII da Escócia que se encontrava exilado em França.
Em
sentido coincidente Albert Mackay na sua obra The History of Freemasonry[ix]
refere que os jacobitas partidários de King James e da dinastia dos Stuarts,
cujos primeiras figuras se encontravam exiladas em Franca na sequência da
disputa sobre o trono inglês entregue ao Principe de Orange e cujos termos se
encontram perfigurados na Magna Carta, terão estado fortemente
envolvidos em actividades maçónicas. De acordo com a teoria que liga os
Stuarts à maçonaria, o terceiro grau das lojas azuis terá sido criado por
estes, aludindo o templo à monarquia, a morte do Mestre à execução de Carlos
I ou à destruição da linha dinástica pela abdicação de Jaime II e o dogma
da ressurreição à restauração da Casa de Stuart no trono de Inglaterra. Uma
das palavras fulcrais no grau, mac..., decorreria de uma expressão gálica
querendo dizer o “filho abençoado” isto é Jaime, filho da viúiva
Henriqueta Maia, mulher do executado Carlos I.
Seja
qual for a verdade desta versão histórica muito contestada pelos historiadores
ingleses, a palavra «escocês» tem levado muitos maçons a pensar que este
rito terá tido origem na Escócia, o que não corresponde exactamente à
verdade. Os historiadores procuram ainda a resposta para este facto. Os
primeiros registos deste termo remontam a meados do séc. XVIII, indiciando o início
do Rito em Bordéus; daí terá sido levado para colónias francesas nas Índias
Ocidentais e posteriormente para os Estados Unidos. As primeiras lojas
parisienses (1725) foram fundadas por jacobitas e o próprio Grão-Mestre Lord
Dertwentwater participou na insurreição de 1745 contra os Hanovers e morreu
decapitado na Torre de Londres. O famoso Discurso de Ramsay inscreve-se na mesma
orientação. Ramsay propunha-se obter o apoio da nobreza francesa e do próprio
Luis XV à causa dos Stuarts[x].
Em
1761, a Grande Loja de França emitiria uma patente em benefício de Etienne
Morin como o objectivo de espalhar o rito escocês pela América. Morin seria
feito Grande Inspector do Novo Mundo e autorizado a criar inspectores em todos
os lugares em que estes graus não estivessem estabelecidos. A chegada em 1795 a
Charleston de dois cidadãos franceses, Alexandre Francisco, Marquês de Tilly e
João Baptista de la Hogue possibilitou um grande impulso do Rito da Perfeição,
como por vezes também é designado. Em 31 de Maio de 1801, Morin estabeleceu o
Soberano Conselho para o Grau 33 do REAA dos Estados Unidos da América em
Charleston, na Carolina do Norte. Os dois frances integrariam o Supremo Conselho
que seria presidido pelo Coronel John Mitchell. Em 1802, o Supremo Conselho
emitiu uma circular a todas as Grande Lojas do mundo datando a origem da Maçonaria
na criação do mundo, declarando-se ainda como guardiã das constituições
secretas que existiam desde tempos imemoriais[xi]. Os graus azuis passaram a ser administrados pelas
Grande Lojas dos Estados; os graus filosóficos pelo Supremo Conselho do REAA[xii].
O
que caracteriza o REAA é a ligação entre uma tradição hermética,
designadamente nos três primeiros graus e uma graduação particular dos Altos
Graus (do 4.o ao 33.o) que é normalmente rejeitada pela maçonaria inglesa. No
primeiro aspecto, a “purificação” pelos quatro elementos inclui-se uma
orientação claramente hermética. Não remontará, como alguma fantasia
insiste em logribar, aos alquimistas da Idade Média mas é provável que tenha
inspiração nos tratados de alquimia vulgarizados no século XVIII e por maçons
adaptado à iniciação maçónica. A purificação pela Terra, pelo Ar, pela Água
e pelo Fogo instilam no candidato, à medida que passa pelas provas, a percepção
gradual do sentido esotérico da “passagem” que faz advindo das profundezas
do mundo terreno para a ascese que lhe é dada pelo sopro do espiritual. É na Câmara
de Reflexão que ele percepciona talvez ainda desatento
três elementos, de enorme sentido esotérico - o enxofre, o sal e o mercúrio
– que lhe serão fundamentais à iluminação final.
O
segundo aspecto particular do rito é a evolução pelos Graus superiores
agrupados em Lojas de Perfeição (4.o ao 14.o), em Capítulos (15.o a 18.o), em
Aerópagos (19.o ao 30.o) e em graus com carácter administrativo (31.o a 33.o).
Talvez como em nenhum outro rito a natureza fundamentalmente alegórica do
caminho maçónico para o conhecimento e para a procura da Palavra Perdida
encontre tão grande e notável expressão. Os graus mostram-se entrelaçados e
a Lenda do Mestre constroi-se passo a passo. A recriação dos mistérios
ligados à reconstrução do Templo de Salomão denota aqui uma vivacidade
particular. O “linguarajar” maçónico deixa de ser ostensivo e transparente,
como nos primeiros três graus azuis, para se tornar translúcido numa reflexão
filosófica sobre o Homem, o seu destino, a sua centelha divina e a constelação
de valores que ditam a sua dimensão racional, muitas vezes minada por desleixo,
a incúria ou o puro dislate.
Os
nomes atribuídos aos vários graus retêm instantes do Velho Testamento e da
sua galeria de figuras históricas e míticas: Mestre Secreto e Perfeito; Secretário
Íntimo, Preboste, Mestre Eleito, Sublime Cavaleiro, Grão-Mestre Arquitecto,
Cavaleiro do Oriente, Príncipe de Jerusalém, Cavaleiro Rosa-Cruz e por aí
fora.
IV.
O RER
O
Rito Escocês Rectificado é um rito cristão terá tido origem na doutrina da Estrita
Observância do século XVIII contida no mais antigo documento maçónico
francês La carte inconnue de la
franco-maçonnerie chrétienne[xiii], revelada segundo Alec Mellor na Revue
Internationalle des Sociétés Secrétes uma revista anti-maçonica do
Monsenhor Jouin.
Trata-se
de um código maçónico cujo texto segue a lógica das Constituições do
pastor Anderson mas que acentua a crença no cristianismo como requisito
fundamental para a crença maçónica, o que tem ligação a uma tradição
cavalheiresca que remonta aos cavaleiros templários. Na sua versão actual o
rito deve muito ao trabalho de condensação, investigação e depuração feito
pelo francês Jean-Baptiste Willermoz, negociante de sedas, que viveu entre 1730
e 1824.
Willermoz
conheceu um pensador extermamente relevante neste rito, Martinez de Pasqually
que fundaria a Ordem dos Eleitos Coens e cuja obra continuou após a partida de
Martinez para São Domingos em 1772[xiv].
Segundo
Mellor, Willermoz foi um frequentador constante de lojas regulares francesas, de
capítulos templários alemães da Estrita Obediência e dos “Philalèthes”
fundando em 1779 a Ordem dos Cavaleiros Benfeitores da Cidade Santa reunindo à
sua volta um grupo de maçons devotados a uma leitura espiritualizada e “mágica”
dos ritos maçónicos entre os quais o referido Martinez de Pasqually, Louis
Claude de Saint-Martin, Joseph de Maistre, e o Conde de Saint-Germain.
Willermoz
ensinava no seu Capítulo que, para encontrar a pedra cúbica, que contém em si
todos os dons, virtudes ou faculdades, é necessário encontrar o princípio da
vida que os Adeptos chamam alkaeter. Esse espírito tem a faculdade de
purificar o ser anímico do homem, prolongando a sua vida.
O
mesmo espírito tem o condão de transformar os vis metais em ouro,
encontrando-se nos três reinos da natureza e cabendo ao prosélito encontrar
maneira de o manipular. A pedra bruta representa a matéria disforme que importa
talhar; a pedra cúbica com ponta piramidal a matéria desenvolvida pela tríplice
acção do Sal, do Enxofre e do Mercúrio.
Segundo
o teosofismo de Martinez de Pasqually em que o código do Rito Rectificado se
inspira a doutrina esotérica deve comportar a revelação de verdades
primordiais, comunicadas noutros tempos a seres privilegiados, mas possível de
ser transmitida áqueles que escolham a via do diálogo íntimo com o Criador.
Segundo
Martinez, a história da humanidade resume-se às consequências do pecado
original e à subdivisão do Homem Primitivo. Deus criou Adão para que fosse o
guardião da prisão onde havia posto os anjos rebeldes. Adão, revestido de uma
forma "gloriosa" comandava toda a criação, mas, seduzido pelos Espíritos
perversos quis ter a sua própria posteridade "espiritual". A criação
de Adão não resultou senão numa forma material (Eva), que constituiu sua própria
prisão futura. Essa condição privou-o da comunicação com o Criador e expô-lo
aos ataques dos espíritos perversos, dos quais ele era anteriormente o Mestre.
A
posteridade de Seth poderá obter sua reconciliação e entrar em contacto
directo com a Divindade, após ter percorrido todas as esferas superiores do
mundo celeste mas Somente a graça da reconciliação do Pai dará a potência e
o poder ao filho. A luz não é dada ao curioso, ao apressado; o Altíssimo a
concede ao Homem submisso aos seus mandamentos e que pratica a sua justiça.
O
regime Escocês Rectificado contou ainda com o trabalho de organização e
depuramento ritualista efectuado pelo Barão de Weiler, que rectificou
certas lojas existentes em Estrasburgo de acordo com o rito da Estrita Observância
Templária da Alemanha, cujo Grão-Mestre da loja de Saxe (região da Alemanha
Oriental) era o Barão de Hund.
Weiler
instalou em 1774, em Lyon, o primeiro Grande Capítulo da região e colocou
Willermoz como chefe ou delegado regional, vindo a ser constituídos outros capítulos
em Montpellier e em Bordéus, cidade onde residia Martinez. O sistema era
constituído por 9 graus, agrupando três classes.
O
Rito Rectificado é portanto o Rito utilizado e praticado pelas Lojas Escocesas
Rectificadas trabalhando estas nos rituais dos "Graus Simbólicos" que
foram condensados e revistos pelos Conventos das Gálias (1778) e de Wilhelmsbad
(1782)[xv].
O
Regime Escocês Rectificado completa-se em seis Graus assim organizados: os
graus de
aprendiz,
companheiro e mestre formam as Lojas azuis ou de S. João, o grau de
Mestre Escocês de Santo André as lojas verdes ou de Santo André e os
graus Escudeiro Noviço e Cavaleiro Benfeitor da Cidade Santa a Ordem
Interior. Está ligado à mensagem de Amor e Tolerância do Novo Testamento
sem detrimento da Justiça vinculada pelo Antigo Testamento.
Nos
dias de hoje, os Grandes Priorados entregaram o governo administrativo das Lojas
azuis às competentes Grande Lojas, conservando, a tutela ritual e simbólica
dos mesmos três graus azuis, através de Tratados de mútuo reconhecimento.
Reservam para si a tutela das Lojas de Santo André e a Ordem Interior.
Existem
Grandes Priorados de C.B.C.S., regulares, em Portugal (Grande Priorado
Independente da Lusitânia[xvi]
(G.P.I.L.), no Togo, na Bélgica, Prefeituras em Espanha (sob tutela de um
Grande Priorado de K.T.) e naturalmente na Suíça, o Grande Priorado
Independente da Helvécia (G.P.I.H.) o qual, historicamente, ficou com as
patentes originais francesas. Todos estes Grandes Priorados mantêm relações
de amizade com os Grandes Priorados Anglo-Saxónicos de Knight Templars (K.T.) e
Knights of Malta (K.M.).
V.
RdE
O
rito de emulação é um dos ritos mais praticados em Inglaterra e pelo mundo. O
rito encontra a sua origem na união em 1813 da Grande Loja dos “Modernos”
com a Grande loja dos “Antigos”. O
rito deve o seu nome mais precisamente ao nome de uma loja “Loja Emulação do
Aprendizagem”[xvii]
que a partir de 1823 foi encarregada de instruir os maçons nas práticas
rituais de que resultaram da união das GL’s e haviam sido adoptadas pela
Grande Loja Unidade de Inglaterra, a potência-mãe da maçonaria regular.
Sob
o impulso de Peter Gilkes e George Claret a loja de aprendizagem ganhou uma
enorme relevância mas segundo alguns autores o facto da GLUI ter levado algum
tempo a publicar o ritual (1969) levou à multiplicação de estilos dentro do
chamado “Rito Inglês”. Talvez por isso importe referir-se o rito inglês
mas praticado segundo diversos “workings” stability, logic, bristol,
west end e outros.
O
rito de emulação é extremamente rigoroso uma vez que as cerimónias são
regidas como sobre a partitura de uma música. O ritual é sabido de cor
e deve ser suficientemente integrado para conferir ao que o exercita a dimensão
de o viver do “interior”, conferindo ainda uma dinâmica de conjunto. A
linguagem corporal tem neste rito um enorme papel mais que a linguagem arcaica
em que o ritual está escrito pelo que cada gesto conta e o “traçar” de ângulos
rectos têm uma significância particular que dispensa quem o pratica de
elaborar sobre a “arte”. A emulação, a concentração no rito é um
momento de enorme intensidade e de concentração do conjunto dos obreiros.
Diferentemente
do REAA as lojas de emulação dispõem de dois expertos [deacons] e de jóias
maçónicas específicas. O Rito de Emulação funciona em Lojas Azuis de três
graus, em moldes idênticos aos outros ritos[xviii]
e é complementado por graus superiores, o que os ingleses designam por “side
degrees” e que são praticados numa Loja de Marca ou num capítulo do Arco
Real [Royal Arch]. Estes graus superiores agregam os graus de Mestre de Marca[xix],
Ex-Mestre, Muito Excelente Mestre Maçom, Mestre Maçom do Arco Real e Escocês
Trinitário.
O
rito de emulação é praticado nalguns países [caso de Portugal] na variação
designada de York por se referir às lojas de Yorkshire que se federaram em 1705
constituindo-se em Grande Loja, na nomenclatura inglesa The Grand Lodge of
all England. Held at York. Segundo regista Alec Mellor[xx]
esta Grande Loja teve grande prestígio desaperecendo no fim do século XVIII.
Esta expressão do Rito de Emulação subsiste nos Estados Unidos sendo o rito
praticado de forma tão abundante como o REAA. No sistema americano há graus
adicionais que complementam o trabalho da Loja, do Capítulo e do Conselho,
ordens agrupadas numa estrutura referida como Rito Americano, Canadiano ou de
York.
VI.
Conclusão
Na
tradição judaico-cristã o conceito de rito refere-se a um corpo de tradição
litúrgica normalmente correspondente a um determinado centro. Temos por exemplo
o rito romano ou latino, o rito bizantino, o rito ciríaco.
O
conceito refere-se também a várias formas de actos religiosos agrupando três
tipos de ritos: os de passagem que produzem alterações na qualidade de
um indivíduo [disso sendo exemplo os sacramentos do baptismo, do casamento ou
da graduação], os de adoração à divindade que têm lugar numa Igreja
Cristã, numa capela, num mosteiro, numa sinagoga, numa mesquita e os ritos de devoção
pessoal que ocorrem em qualquer lugar sagrado ou numa peregrinação
religiosa a um local de particular devoção [Lourdes, Meca].
Na
tradição simbólica e esotérica maçónica o rito é sobretudo uma expressão
da interpretação dos usos e costumes da Fraternidade, das tradições
transmitidas oralmente, desde que os maçons se reúnem a coberto para
glorificar o Criador e fazer novos avanços na Arte Real. Dependendo das fontes
há 300 anos ou há 1000 anos.
A
mais importante diferença é que os ritos não são para os Maçons e as suas
organizações bíblias, dogmas ou repositórios inquestionáveis de uma Verdade
absolutizada ou sectarizada. São interpretações, exegeses, mergulhos na mais
profunda dimensão dos Homens Livres, a sua profunda espiritualidade e sede de
perfeição. São caminhos mas não são O Caminho.
Esse
cada um O procura e O encontra ou não. Em liberdade, afinal a condição
primeira dos Homens Livres, dos Livres Pensadores, dos talhantes da pedra bruta
e os exaltantes do ashlar.
[i]
In Infopédia. Porto: Porto Editora, 2003-2007. [Consult. 2007-04-04].
[ii]
Alec Mellor, Dicionário da Franco-Maçonaria e dos Franco-Maçons,
Martins Fontes, S. Paulo, Junho de 1989.
[v]
Os evangelhos S. Mateus, S. Marcos, S. Lucas e S. João aprovados no Conçílio
de Niceia como os oficiais da Igreja Católica.
[vi]
Paul Naudon, “A Franco-Maçonaria”, Publicações Europa-América, Lisboa,
1977.
[viii]
Cf. “The Second Messiah. Templars, the Turin Shroud & the Great Secret
of Freemasonry”, Arrow Books Limited, 1997.
[ix]
Edição da Random House, New Jersey, 1996.
[x]
Alec Mellor, Nos fréres séparés, les franc-maçons, Paris, Mame,
1963 e mesmo autor Dicionário da Franco-Maçonaria, ibid.
[xi]
Alec Mellor, Dicionário da Franco-Maçonaria, ibid.
[xii]
Rizzardo da Camino, Rito Escocês Antigo e Aceito (Graus 1.o ao 33.o), Madras
Editora, S. Paulo, 1997.
[xiii]
Em português “A carta desconhecida da Franco-Maçonaria cristã”, Alec
Mellor ibidem.
[xiv]
Willermoz foi iniciado por Martinez em Versailles, perto de Paris, no Equinócio
de Março de 1767, quando este instalou o seu Tribunal Soberano de Paris.
[xv]
Nuno Nazareth Fernandes, Gomes Freire de Andrade e o RER.
[xvi]
Em Portugal o RER está na origem da Grande Loja Regular de Portugal (Graus
azuis) tendo as Lojas de Santo André e a Ordem Interior sido introduzidas
pelo Grande Priorado Independente da Helvécia com a criação do Grande
Priorado da Lusitânia.
[xvii]
Ver http://www.emulationritual.org/.
A l'Emulation Lodge of
Improvement reúne-se todas as sextas feiras de Outubro a Junho às 18.15 no
Freemasons' Hall, Great Queen Street, Londres, WC2B 5AZ
[xviii]
C.W. Leadbeater refere em Freemasonry and its Ancient Mystic Rites, Random
House, Nova Iorque et alia, 1986, pp. 151-2, que não terá sido sempre assim,
uma vez que as Constituições de 1723 apenas falavam em aprendizes e
companheiros. Em 1725 a GLUI emitiu uma directiva determinando que “o Mestre
da Loja, com o consentimento dos
vigilantes e da maioria dos Irmãos que serão mestres, podem “fazer”
mestres de acordo com a sua conveniência”.
[xix]
O Mestre de Marca é tido pelo mais antigo grau maçónico e um dos mais
prestigiados.
[xx]
Alec Mellor, Dicionário da Franco-Maçonaria, ibid.
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