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MONOGRAFIAS MAÇÔNICAS

pelo Ven.Irmão WILLIAM ALMEIDA DE CARVALHO 33


DUQUE DE CAXIAS
Uma Pequena Sinopse Maçônica


 

                                    "Prefiro cometer uma injustiça a tolerar uma desordem".

                                                                                                            Goethe

 

"Consinta V.Excia. que como amigo lhe  diga,

que espero seja esta a última vez que me en-

carregue de pacificar alguma  Província  que

tenha por Presidente pessoa que  nela  tenha

estado na ocasião da revolta, muito  princi-

palmente sendo paisanos,  que  quase  sempre

tanto tem de poltrões durante o perigo, como

vingativos depois  dele  passado  (salvo  as

honrosas exceções)."

 

                                                        Carta do Barão de Caxias ao Ministro da Guerra

                                                                        ***

 

"Senhor! O primeiro soldado de vossas tropas

que atravessar a fronteira, fornecerá o san-

gue com que será assinada a paz de  Piratini

com os Imperiais. Acima de nosso amor à  re-

pública colocamos o nosso brio, a integrida-

de da Pátria. Se puserdes  agora  os  vossos

soldados na fronteira, encontrareis ombro  a

ombro, os soldados de Piratini e os soldados

do Sr. D. Pedro II."

 

        Resposta de David Canabarro ao ditador Rosas

 

 

I - INTRODUÇÃO

            O objetivo do presente trabalho foi o de tentar levantar alguns traços maçônicos do Duque de Ferro para a ARLS Duque de Caxias nº 2589. Durante o ano de 1993 ao fazer o CAEPE (Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia) da Escola Superior de Guerra no Rio de Janeiro, desliguei-me, momentaneamente, da minha Loja-Mãe, a ARLS Equidade e Justiça nº 2336, no Oriente de Brasília e passei a freqüentar, com muito prazer e orgulho, a loja que tem o nome do Duque.

            A referida loja tem algumas peculiaridades que convém ressaltar. É, também, uma loja para os militares e os civis, em trânsito, que estão fazendo curso na ESG, na ECEME, na ECEMAR, etc. Possui, ipso facto, uma plêiade de elementos de alto coturno intelectual e moral ávidos de estudar e pesquisar problemas maçônicos e questões relativas ao Brasil. Fui testemunha, no citado ano, da criação do Centro de Estudos Maçônicos Duque de Caxias, dirigido por esta loja. Assim como existem "teatros de bolso", apelidei a Loja Duque de Caxias de "loja de bolso", por ser uma loja pequena mas aguerrida, seria o que os hispano-americanos chamam de "chiquitita pero cumpridora".

            O presente trabalho busca, assim, ser uma espécie de pagamento simbólico pelo período que a passei freqüentando.

            Trabalhos profanos sobre Caxias existem em abundância, contudo o Caxias maçônico está para ser estudado. Lembrei-me, em meados de 93, de que o Ir\ Kurt Prober tinha feito um dos poucos trabalhos maçônicos sobre o Duque. Em agosto, telefonei-lhe para buscar mais dados sobre este trabalho. O velho tronco de jequitibá - Kurt - disse-me que, realmente, em 1972 fizera um trabalho sobre o Ir\ Caxias, pois, ao ingressar na Academia Maçônica de Letras na cadeira nº 4, tinha o Duque como patrono e, como praxe, o novo "imortal" tinha o dever de fazer uma elegia ao patrono. Ansioso, queria saber onde poderia obter o trabalho. Kurt respondeu que estava esgotado, mas que, talvez, houvesse uma cópia na biblioteca do GOB no Lavradio. Daí a dois dias entrei em contato com o Ir\ Borba, responsável pela biblioteca, que me tranqüilizou sobre a monografia de Kurt Prober intitulada - Duque de Caxias - Sua Vida na Maçonaria.

            Saliento ainda que, no referido ano, o Ir\ Castellani lançou seu livro sobre a História do Grande Oriente do Brasil. Procurei, então, tendo os dois trabalhos como as colunas J\e B\, ousar escrevinhar alguma coisa sobre o herói da nacionalidade.

            O trabalho procura situar o Duque em três dimensões: i) a sinopse profana de Caxias, para a qual me vali do excelente livro de Affonso de Carvalho, editado pela Bibliex; ii) Caxias situado dentro do contexto obediencial da época - GOB, GOP (Grande Oriente do Passeio) e Supremo Conselho - tão bem estudados pelo livro do Ir\Castellani e iii) a sinopse propriamente maçônica do Ir\Caxias, lastreado na monografia original e, até o momento, única do Ir\ Kurt.

            Esta pequena pesquisa, baseada em dados secundários, visa, entretanto, despertar nos irmãos maçônicos, sejam os da Loja Duque de Caxias, os do Centro de Estudos Maçônicos, os do Exército, os do Estado do Rio de Janeiro, do Maranhão, de São Paulo, de Minas Gerais, do Rio Grande do Sul, em suma, das instituições e dos Estados da Federação por onde o Pacificador tenha deixado o seu rastro, o sentido de procurar, agora, nos arquivos do Duque, no Exército, ou nos Estados, maiores dados sobre o pouquíssimo estudado Caxias maçônico.

            Não poderia deixar de terminar esta introdução sem os agradecimentos, não só de praxe, mas, principalmente, de fraternidade maçônica. Além do referidos autores, citados acima, sou extremamente grato aos seguintes IIr\ da ARLS Duque de Caxias: Roberto Fredenhagen (Ex-Ven\), Joel Barreto Miranda (Ven\), Flávio Aníbal Ramazzini, Sérgio Roberto Dentino Morgado, Nelson Tinoco Vianna, Hamilton Cavalieri D'Oro, Benedito Normando Simões Filho, Newton de Magalhães, Edvard Cavalcanti Leite, Marco Fernando Aragão Mendes, Jorge Mathuiy, César Dal Pai Dienstmann, Ênio da Silva, Hélio André Klein, Antônio Leite Filho, Pedro Vitorino Cordeiro Vargas e tantos outros que corro o risco de esquecer.

            Nestes momentos de crise por que passa o nosso querido Brasil, possa o Duque de Caxias, que tão bem soube viver as galas da Corte e a glória das Armas, ser o nosso inspirador, para que a Nação consiga encontrar o seu projeto nacional nesse limiar do século XXI.

 

 

II - SINOPSE PROFANA

            Luiz Alves de Lima e Silva, futuro Duque de Caxias, nasceu a 25 de agosto de 1803 na Fazenda de São Paulo, no Taquaraçu, na vila de Estrela da Província do Rio de Janeiro.

            Descendia de velhos troncos portugueses, especialmente os Silvas, os Fonseca, os Limas, os Brandões, os Soromenhos e os Silveiras, como se observa pelo seu brasão de armas.

            Era filho do Brigadeiro Francisco de Lima e Silva e de D. Cândida de Oliveira Brito. Seu pai, em 1824, como general do Exército Imperial em Pernambuco,  comandou a pacificação da Confederação do Equador. Como brigadeiro apresentou nos seus braços à Corte, a 2 de dezembro de 1825, no Paço de S. Cristóvão, o rebento que viria a ser o futuro Imperador D. Pedro II, nascido naquele dia. Em 1828 assume o comando de armas na província de S. Paulo e, dois anos depois, o comando na Capital do Império. Tomou parte efetiva no 7 de abril, quando da abdicação de D. Pedro I, não só por liderar o Exército como por se tornar Regente, fatos que concorreram para que, mais tarde, viesse a sofrer um certo amargor por parte do futuro Imperador. Anos mais tarde foi eleito senador pelo Rio de Janeiro.

            Caxias descendia, também, de uma ilustre plêiade de militares, tendo vários tios como marechais e generais.

            Com quinze anos de idade assenta praça como 1º cadete, no primeiro Regimento de Infantaria de Linha.

            Em 1818, o jovem Luiz, quando cursava o primeiro ano da Academia Militar, é promovido ao posto de alferes  para a 5ª Companhia de Fuzileiros da Guarnição da Corte. Passa a tenente em 1821 e ao terminar o curso, é nomeado ajudante do 1º Batalhão de Fuzileiros. Passa, em seguida, a fazer parte do Batalhão do Imperador, tropa de elite criada por D. Pedro I.

            Em março de 1823, o Batalhão do Imperador, comandado pelo Coronel José Joaquim de Lima e Silva, seu tio, segue com destino à Bahia afim de lutar contra o general Madeira e, onde Caxias receberá o seu primeiro batismo de fogo, em 3 de maio. Por bravura recebe o Hábito do Cruzeiro, considerado à época a mais alta distinção militar. Participa do 2 de julho em Salvador, carregando o pavilhão do Império no desfile de libertação.

            Com a volta do Batalhão do Imperador ao Rio, Caxias é promovido a Capitão e, logo em seguida, mandado para a província rebelde da Cisplatina, onde recebe o Hábito de Aviz, mais uma vez por bravura em campo de batalha. Nas horas livres em Montevidéu, apaixona-se pela Marquesa de Montes Claros e o romance só não prospera por ser chamado de volta à Corte, em dezembro de 1828.

            Ainda neste final de ano, é promovido à major e, no começo do ano seguinte, recebe a Ordem da Rosa. A perda da Província rebelde da Cisplatina e a crescente influência do partido português junto ao Imperador concorrem para a impopularidade do jovem monarca. A alternância dos partidos no poder, sem resolver os angustiantes problemas da nação infante, culminam com uma insurreição popular pedindo a abdicação de D. Pedro I. Caxias tinha consciência de que, com a queda do Imperador, a nação se defrontaria com a rebeldia em diversos pontos do território nacional. D. Pedro tenta, ainda, apelar para Caxias que não se furta em respaldar o Imperador, desde que este assinasse um decreto, concedendo baixa a todos os soldados de primeira linha, deixando, assim, isolados os oficiais rebeldes. D. Pedro considera uma temeridade tal solução, desobrigando, então o jovem major de sua lealdade ao Imperador. E acontece o 7 de abril de 1829.

            Caxias sentia que o período da Regência, nesta primeira fase denominada de Provisória, tendo seu próprio pai como um dos regentes, seria um momento de imensos perigos para a unidade nacional do novo país que se implantava. As revoltas começaram, então, a proliferar, não só na Corte como nas Províncias.

            Após o 7 de abril, a journée des dupes a que se referia Teófilo Otoni, "quatro grupos disputavam o poder: - os absolutistas, corcundas, ou mais conhecidos pelo nome de caramurus, partidários infatigáveis da Restauração; os constitucionais; os republicanos e, finalmente, os cautelosos oportunistas, apelidados de tatus ou caracóis"([1]).

            O jovem Major sente que o Exército é um aglomerado de elementos das mais diversas origens - italianos, alemães, dinamarqueses e, principalmente portugueses - sem possuir, ainda, uma identidade nacional. Concebe, então, uma medida radical: formar um batalhão somente de oficiais - o Batalhão Sagrado, que veio a prestar serviços relevantíssimos, até quando Feijó manda dissolvê-lo em 1833. Eram conhecidos sob a alcunha de Voluntários da Pátria, que perdurou até a Guerra do Paraguai.

            Em abril de 1831, já na Regência de Feijó, acontece a abrilada, com a tentativa de proclamação de uma república no Campo de Santana pelo Major Miguel de Frias. Caxias vence a revolta e consolida a Regência na Corte.

            Em 2 de fevereiro de 1833 casa-se com Ana Luíza de Carneiro Viana, filha do Desembargador Paulo Fernades Viana, intendente geral de polícia da Corte, e descendente da aristocrática família Carneiro Leão. Ana Luíza, a encantadora Anica, deu-lhe três filhos: duas mulheres e um homem, sendo que este veio a falecer prematuramente, fato que lhe causou profunda dor por toda a vida. O amor por Anica durou por toda sua existência, durante os 41 anos que permaneceram casados foi um exemplo de virtude e dedicação. Anica só possuía um único concorrente: o Exército, que lhe roubou boa parte do tempo de seu marido.

            Em 1835 explode na Província do Rio Grande a Guerra dos Farrapos que começava, então, a incomodar a Regência e perdurará por mais de 10 anos.

            Em setembro de 1837 Caxias é promovido a tenente-coronel. Segue com o Ministro da Guerra - Sebastião do Rego Barros - para o teatro de operações no Sul do País. A chama da insurreição, contudo, não se confina ao Sul, e em 1840, o tenente-coronel é chamado a pacificar a Província do Maranhão, naquele movimento que é descrito na História do Brasil como a Balaiada. As forças centrípetas começavam a se espalhar pelas províncias, os movimentos insurrecionais pululam por todo o país.

            O quadro geral de miséria e a incompetência da oligarquia tradicional levaram os rebeldes, depois de saquearem várias cidades e fazendas no Maranhão e no Piauí, a tomarem a cidade de Caxias na Província do Maranhão.

            Em dezembro de 1839, Caxias é promovido a Coronel e, ao mesmo tempo, para poder ter maior liberdade de ação, é nomeado Presidente e Comandante de Armas do Maranhão e Comandante do Exército Pacificador. Parte do Rio de Janeiro em 22 de dezembro e chega a São Luís à 4 de fevereiro de 1840. Faz um apelo à concórdia e não se deixa enredar nas vinganças mesquinhas dos políticos da região. Organiza três colunas para combater na região de Vargem Grande, na de Caxias e na zona do Icatu. Após libertar a cidade de Caxias, diversos bandos de cangaceiros resolvem se entregar. Emprega, então, tática astuciosa: indulta-os e ordena que persigam os demais recalcitrantes.

            Recebe, em 23 de agosto de 1840, a notícia da declaração da Maioridade de D. Pedro II e de sua ascensão ao trono. Como num passe de mágica, os Cabanos e os Bentevis, que até então se engalfinhavam ferozmente, resolvem fazer as pazes em honra ao jovem monarca. Caxias publica um indulto em nome do Imperador e anuncia a pacificação do Maranhão em 1º de janeiro de 1841. O governo, num preito de reconhecimento, promove-o a general em julho de 1841 e outorga-lhe o título de Barão de Caxias.

            Na Corte, a luta política entre Liberais e Conservadores irá se espraiar pelas armas para as Províncias de S.Paulo e Minas Gerais. Em 1841 os conservadores derrubam os liberais que estavam há oito meses no poder, desde o golpe da Maioridade. Após a dissolução das Câmaras, acende-se o estopim da revolta em S. Paulo, com o manifesto lançado pelo Brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar, que acabara de deixar o governo da Província de S. Paulo, é aclamado Presidente interino da Província e presta juramento perante a Câmara na cidade de Sorocaba. Os liberais contavam com nomes de alto coturno nas suas hostes: Padre Antônio Feijó, Teófilo Otoni, Antônio Carlos Ribeiro de Andrade, seu irmão Martim Francisco, Limpo de Abreu, etc. A sedição de Sorocaba esperava contar, dentro em pouco, com a adesão de Minas Gerais e dos farroupilhas no sul.

            O movimento em S. Paulo estoura em 18 de maio de 1842 e o general e Barão de Caxias parte para a Província rebelde no dia 19.

            Os paulistas, pela voz de Antônio Carlos, desdenham do Pacificador do Maranhão: "para combater homens da Pátria de Amador Bueno, mandam-se 400 cadáveres ambulantes".

            O Barão de Caxias, num lampejo de gênio, verificando que os rebeldes não tinham tomado a capital da província, parte do Rio a bordo de um vapor, no dia seguinte chega a S. Sebastião, aporta em Santos no dia 21, requisita rações para 2000 homens e numa arrancada desembarca na capital paulista, deixando atônitos os rebeldes pela sua mobilidade e velocidade. O restante da campanha foi, no dizer de Oliveria Lima, uma passeata militar do General Barão de Caxias. Sorocaba cai em poder das forças legais em 20 de junho de 1842. A demora do Barão em Sorocaba não passa do dia 28; volta à capital, onde é recebido com festas, e inicia o retorno ao Rio em 8 de julho, passando por Taubaté no dia 13. Em Guaratinguetá recebe a notícia de que é nomeado general-chefe das forças pacificadoras na Província de Minas Gerais. Desembarca no Rio em um vapor a 24 de julho, e na mesma noite é recebido, pelo Imperador, para jantar no Palácio, onde se anuncia a notícia do decreto que o nomeia Ajudante de Campo do Imperador.

            A revolução liberal mineira estoura a 10 de junho de 1842, na véspera do embarque do Barão para as plagas paulistas. Ali a revolta será mais difícil de combater que a paulista, visto que os mineiros contarão com um recurso inestimável: o terreno. Tanto em S. Paulo quanto em Minas, os rebeldes sempre ressaltaram a figura do Imperador, sejam Tobias Aguiar e o Padre Feijó em S. Paulo quanto José Feliciano em Minas Gerais.

Uma coisa era comum aos chefes rebeldes: a morosidade nas ações armadas, fato que o Barão aproveita com maestria.

            A revolta se espraia feito epidemia nas terras das Gerais, mas na Corte um ministério de grandes homens está atento: José Clemente Pereira, Ministro da Guerra; Honório Hermeto Carneiro Leão, Marquês do Paraná, Presidente da Província do Rio de Janeiro; e o Barão de Caxias, já, então, a maior figura militar da época. O segundo ministério conservador contava com figuras de proa: o Marquês de Sapucaí, na pasta do Império; o Visconde do Uruguai, na pasta da Justiça; o Visconde de Sepetiba, na de Estrangeiros; o Marquês de Abrantes, na da Fazenda; e o Marquês de Paranaguá, na da Marinha. Se os liberais contavam com nomes de alto coturno, os conservadores não ficavam atrás!

            A estratégia do governo constava de quatro pontos: i) atuar por partes; ii) esmagar S. Paulo e vigiar Minas; iii) não nomear nenhum comandante em Minas enquanto não resolvesse o contencioso paulista; e iv) terminado o "affaire" paulista, esmagar os mineiros.

            O Barão emprega a mesma tática de S. Paulo: ocupar o mais rápido possível a capital da província. "Não se trata no caso propriamente de uma simples marcha. É, antes, um  através das montanhas mineiras, e um “raid” com o arrastar da artilharia"([2]).

            Ouro Preto é ocupada em 6 de agosto de 1842 debaixo de ruidosas manifestações populares. O Barão profliga os políticos mineiros em carta ao Ministro da Guerra, como está assinalado nas citações no começo deste trabalho. Os rebeldes começam a desesperar-se com a notícia da rendição de Sorocaba e a ocupação de Ouro Preto. Teófilo Otoni propõe uma saída negociada honrosa que é rechaçada, “in limine”, por José Feliciano que, logo a seguir, toma Sabará. Os rebeldes, então, mandam Manuel de Melo Franco ao Rio afim de obter um decreto de anistia do Imperador. Melo Franco tenta, ainda, escrever ao Barão propondo uma anistia. Desconhece que o Barão só anistia depois da deposição das armas. Antes não! 

            O Barão embarca para Caetés, onde reúne todas as forças legais e resolve marchar contra Sta. Luzia, pela estrada de Sabará, em três colunas: a da direita, comandada pelo seu irmão, Coronel José Joaquim de Lima e Silva, a do centro, pelo próprio Barão e a da esquerda pelo Tenente-coronel Ataíde. A intenção do Barão é chegar no dia 20 e atacar no 21, com as duas colunas fustigando os respectivos flancos.

            O pouco conhecimento do terreno e o espírito ofensivo dos mineiros levam o Barão a ser atacado ao invés de atacar, e no dia 20 é obrigado a aceitar o combate. A situação do Barão torna-se periclitante, pois o Coronel Lima e Silva só estava preparado para a luta 24 horas depois. E, numa espécie de Grouchy dos trópicos não aparece no momento crucial da batalha. No momento em que os mineiros estavam prelibando o instante da vitória sobre o Barão, eis que o Coronel Lima e Silva, ouvindo a distância os tiros de artilharia, resolve acelerar o passo e entrar na batalha, e tal qual um Blücher, decide o destino do conflito armado. Não seria, desta vez, que o Barão haveria de perder uma batalha.

            Com a vitória de Sta. Luzia terminou a revolução liberal em Minas Gerais e a província, logo, voltará à normalidade.

            A 1º de setembro o Barão retorna a Ouro Preto, lança um manifesto de confraternização ao povo mineiro, é promovido a marechal-de-campo e chega à Corte em 21 de setembro.

            No final de 1842, com o final das campanhas do Maranhão, de S. Paulo e de Minas Gerais, a espada do Império estava pronta para debelar a revolta de Farrapos. É nomeado, a 28 de setembro, ao mesmo tempo, Presidente da Província e Comandante das armas. Ao chegar a Porto Alegre em 9 de novembro lança um manifesto onde faz um apelo de união ao povo gaúcho. O Barão enfoca o problema do sul de três maneiras: i) prepara uma distensão do ambiente para restabelecer a atividade comercial da província em todas as direções; ii) reconhece que o fenômeno do caudilhismo, seu conhecido da época da campanha da Província rebelde da Cisplatina, deverá ser contido numa zona contígua, privando-o das faixas de fronteiras, por onde poderia se comunicar com os uruguaios; e iii) o sistema de combate com os rebeldes será o de guerrilhas, com ataques de surpresa e, para tanto, o cavalo e a remonta serão cruciais.

     Astutamente, procurou cooptar o chefe rebelde, Bento Manuel, para as hostes legalistas, infiltrando-se, assim, nos meandros dos meios e modos de combater dos homens do sul. Além do mais, Bento Manuel nunca tinha perdido uma batalha, o que não acontecia com Bento Gonçalves, que a exemplo de George Washington, era mestre na arte de perder batalhas.

            Caxias ruma para Alegrete, local de estacionamento das forças republicanas, que, ao saberem, da aproximação do Barão, abandonam a cidade. Os rebeldes contra-atacam em S. Gabriel, onde estava estacionada a bagagem pesada dos imperiais, surpreendendo-os e arrebatando-lhes a cavalhada.

            Com a divisão do exército em duas colunas, os rebeldes tentam dar combate à coluna comandada por Bento Manuel, que lhes infringe uma derrota em Ponche Verde. O começo do fim, no início de 1844, entretanto, será a batalha de Porongos, onde o exército imperial vinga a derrota de S. Gabriel.

            Já no início de 1845 os chefes rebeldes, reunidos em Ponche Verde deliberaram sobre a necessidade da paz. David Canabarro e outros chefes assinam a ata de pacificação e dirigem aos seus companheiros uma proclamação, finalizando o período da guerra civil.

            O Barão é recebido, como sempre, com manifestações calorosas pelo povo da capital da província, que o elege, em lista tríplice para o Senado do Império, sendo escolhido pelo Imperador para Senador em 30 de agosto de 1845, ingressando, dessa maneira, na vida política do país. Se os conservadores podiam contar com o Barão nas suas hostes, os  liberais,  por  outro, lado, tinham uma compensação: conseguiram cooptar Osório.

            O Barão, também, é efetivado marechal-de-campo em 2 de março e agraciado com o título de Conde quando suas atas de eleição senatorial chegam à Corte. Recebe, antes de partir, a comitiva imperial em visita ao Rio Grande. Governara a província por três anos e meio.

            No Senado do Império encontra seu velho pai, senador pela província fluminense, que lhe fará companhia até a sua morte no ano de 1853.

            De 1847 a 1851, com o país pacificado e integrado, dedica-se aos afazeres da política no Senado, quando se inicia um segundo ciclo na sua vida: os primeiros conflitos externos da nação brasileira. O tiranete Oribe na República Oriental, apoiado pelo ditador Rosas da Confederação Argentina, começa a criar complicações na fronteira da Província do Rio Grande. O ditador argentino alimentava pretensões de anexar o Paraguai e o Uruguai. Com a ameaça de rompimento do equilíbrio na "cuenca del Plata", o Império é obrigado a intervir e, para tanto, o Conde é nomeado, em 18 de junho de 1851, Comandante-chefe do Exército e, pela segunda vez, Presidente da Província do Rio Grande. O Brasil tem como aliados nesta guerra o Governador da Província de Entre-Rios - o General Urquiza - e as forças anti-Oribe da República Oriental, comandadas pelo General Gerzón. As diretrizes do Conde são claras: a invasão do território uruguaio e o apoio da esquadra, comandada pelo Almirante Grenfell. 

            O Conde deixa a Corte e, a bordo do vapor Imperatriz, dirige-se à Porto Alegre e, de lá, se estabelece em Santana do Livramento, onde concentra suas forças. O exército é dividido em quatro divisões e dez brigadas, num total de 16200 homens, além de 4000 homens distribuídos pela fronteira. Convém salientar que vários comandantes farroupilhas estavam sob as ordens do Conde e o pino de ligação com as forças do general Urquiza era o Tenente-Coronel Osório. À 4 de setembro, às 7 horas da manhã o Conde invade o território uruguaio. O rolo compressor brasileiro, gradativo mas lento pela estação chuvosa, e o isolamento, pela Marinha, das forças de Rosas e Oribe, concorrem para que Oribe negocie com o general-caudilho argentino Urquiza uma paz em separado, sem a presença do Conde. Apesar dos dissabores, o Conde é recebido entusiasticamente em Montevidéu. Lá, reúnem-se os vultos argentinos exilados - Mitre, Sarmiento e Paunero - e os diplomatas brasileiros - os futuros Marquês do Paraná e Visconde do Rio Branco, preparando, assim, a queda de Rosas, que, com a derrota de Oribe, tinha os seus dias contados.

            Urquiza, no comando das forças, resolve concentrar os exércitos aliados em Diamante, à margem direita do Paraná. "O plano dos aliados é simples: atacar o ditador Rosas pela margem direita do rio, investindo contra Buenos Aires, enquanto Caxias, na Colônia do Sacramento, fica com o grosso do Exército em observação e articulado com a esquadra para o ataque à capital, caso seja necessário"([3]).

            Com a demora do deslocamento de Urquiza, o Conde resolve, à borda da corveta D.Affonso, fazer um reconhecimento da capital argentina. O espanto no porto de Buenos Aires é indescritível quanto se notam as insígnias do general-chefe do Exército brasileiro e o pavilhão do Almirante Grenfell. As canhoneiras das estações navais inglesa e francesa saúdam com suas peças os dois chefes brasileiros. A corveta imperial responde às salvas e Caxias faz, tranqüilamente, o seu reconhecimento por mais de seis horas, deslocando-se, a seguir, para o seu posto na Colônia do Sacramento.

            Em 3 de fevereiro de 1852 tem início a batalha de Caseros às 8 horas da manhã. A divisão brasileira, comandada pelo General Marques de Souza, espera impaciente por Urquiza, que não aparece e pela Divisão Galan, que deveria atacar e não o faz! O futuro Conde de Porto Alegre, que não tinha vocação de Grouchy, resolve atacar, decidindo, assim, o destino da batalha. O desaparecimento de Urquiza deveu-se aos seus rompantes gauchescos que, descurando a sua missão de comandante de exército, preferia o combate cara-a-cara!

            Rosas foge à galope para Buenos Aires e, disfarçado em marinheiro, refugia-se num navio inglês. O Exército Aliado entra, triunfalmente, em Buenos Aires sem disparar um tiro a 12 de fevereiro de 1852. Como sempre o Conde é recebido entusiasticamente na capital portenha. Voltava à Corte já, agora, como tenente-general e Marquês (26-06-52) e, no peito, a medalha de ouro, do Uruguai.

            O Marquês chega doente à Corte, seguindo, incontinente, para uma estação de águas em Caxambu, quando é chamado de volta, por causa do falecimento de seu pai. Passa os anos de 53 e 54 em atividades políticas no Senado. Em 14 de junho de 1855 é nomeado, pela primeira vez, ministro de Estado. Com a renúncia do General Belegarde na pasta da Guerra, um nome se impõe como o novo Ministro da Guerra: o Marquês de Caxias. Como é de seu feitio, primeiro toma contato devagar com a nova realidade, para, em seguida, decidir com argúcia. Determina que as promoções se façam com a mesma data para todas as armas. Propõe, pela primeira vez, o estuda da tática elementar nas três armas, nacionalizando, por assim dizer, o estuda da tática. Contrata veterinário na França e um picador em Portugal para mestre de equitação. Fortalece o Conselho Supremo Militar, transfere para a Fortaleza de S.João a instrução prática, cria os conselhos econômicos. O grande benefício feito ao Exército, contudo, foi a criação da repartição do ajudante-general. "Na época, todos os negócios do Exército eram dirigidos direta e exclusivamente pelos Ministros da Guerra, figuras geralmente políticas, flutuantes e, por isso mesmo, na maioria dos casos, pouco conhecedoras dos problemas militares.

            O novo ministro, reconhecendo todos esses inconvenientes, cria uma repartição estável, incumbida, realmente, da direção do Exército. Que os ministros passem e que tenham a missão precípua de defender os interesses do Exército perante o Parlamento, e que ela fique, mantendo-se à revelia da política, e assegurando ao Exército unidade de ação e de doutrina e a continuidade de todos os serviços"([4]). A lei de 30 de junho de 1856, que autoriza a importante inovação, é o embrião do Estado-Maior do Exército.

            Quando falece o Marquês do Paraná, em 3 de setembro de 1856, chamam-no para ocupar a Presidência do Conselho de Ministros, que acumula com a pasta da Guerra. Em 3 de maio do ano seguinte, com a queda do gabinete, volta ao Senado, para ser, em 1858, nomeado Conselheiro de Guerra.

            Em 1861, a 3 de março, novamente, é nomeado Presidente do Conselho, que acumula com a pasta da Guerra. Enquanto , na primeira nomeação era mais Ministro da Guerra do que Presidente do Conselho, pois foi galgado pelo imprevisto do falecimento do Marquês do Paraná, agora, contudo, detém, com a experiência acumulada, as rédeas firmes da Presidência do Conselho. Apesar de passar pouco tempo na direção do Governo, realiza as seguintes obras: providências relativas ao serviço militar obrigatório, à justiça militar e às colônias militares; abolição dos velhos processos disciplinares do Conde de Lippe e adoção do Regulamento Correcional das Transgressões Disciplinares, embrião do Regulamento Disciplinar do Exército.; promoção do novo Código Penal Militar.

            O Gabinete, na eterna gangorra do IIº Império, cai em 24 de maio de 1862, e é substituído pelo do liberal Zacarias de Góes. Neste mesmo ano dois fatos relevantes: i) o falecimento de seu filho e a sua promoção a marechal graduado. Permanece exercendo suas funções no Senado e como Conselheiro de Guerra, quando estoura a guerra do Paraguai, com o aprisionamento do Marquês de Olinda e a invasão do Mato Grosso.

            Com a assinatura do Tratado da Tríplice Aliança - 1º de maio - o nome que se impõe, como unanimidade nacional, é o do Marquês, mas Caxias é conservador e o gabinete é liberal! As questões político-partidárias sobrelevam às de segurança nacional. O impasse político foi o de querer ser nomeado, ao mesmo tempo, Comandante-em-Chefe do Exército e Presidente da Província do Rio Grande, como das vezes anteriores, para melhor desempenho da missão. Iria prejudicar a política do partido liberal na província! E o nomeado, em seu lugar para a pasta da Guerra, foi o Visconde de Camamu, o único general com quem o Marquês não tinha relações de amizade.

            Com a declaração de guerra e a invasão do território nacional a situação começa a se tornar grave, tanto que o Imperador resolve embarcar para o sul e, para tanto, deverá levar o Marquês por ser o seu marechal-de-campo. Situação deveras constrangedora para o Marquês por ter de suportar a presença de seu inimigo - o Ministro da Guerra - e o Conde D'Eu, cuja maior ambição era ser comandante-em-chefe do Exército brasileiro e que movia uma guerra surda ao Marquês.

            O Imperador, ainda em presença do Marquês, assiste à rendição de Uruguaiana, onde copioso material de guerra cai em mãos dos Aliados. Nem bem assentara a poeira de Uruguaiana estoura, na Corte, a Questão Christie que, depois de intensas gestões diplomáticas, tem uma solução feliz.

            Depois de um ano de guerra, a avaliação não é das mais animadoras. Apesar das vitórias de Riachuelo e Tuiuti, o Exército Aliado só penetrou 14 quilômetros em território inimigo. A gota d'água, entretanto, foi o desastre de Curupaiti, que teve o mérito de acordar a nação e trazer de volta o Marquês, que é nomeado Comandante-em-Chefe das forças do Império em 10 de outubro de 1866. Um Ministro forte, conservador, num Gabinete liberal... As intrigas não demoram a pulular e o desfecho será a tão propalada queda do Gabinete Zacarias em 1868.

            O Marquês parte da Corte a 29 de outubro, passa por Montevidéu, Buenos Aires, Corrientes e Itapiru, chegando a Tuiuti em 18 de novembro. O moral do Exército deixava a desejar pela frouxidão dos costumes e o gradativo esmaecimento das virtudes militares. Como era do feitio do Marquês, primeiro reorganizar num processo aparentemente lento para, em seguida, lançar, com o máximo de velocidade, o rolo compressor. É, nesta fase, que se estuda o gênio organizador do Marquês.

            Em 21 de julho de 1867, o Marquês considera terminada a fase da preparação e a necessidade de sair da defesa passiva em que o Exército se encontrava desde maio de 1866. No dia 22 tem início a marcha de flanco para Tuiu-Cuê, que terminará, nesta primeira fase, com o Exército vencendo o meio agreste do Chaco e a Marinha quebrando as correntes da fortaleza de Humaitá.

            Após a vitória de Humaitá, o Marquês esbarra com as instalações defensivas de Pequiciri - nove quilômetros de linha fortificada - e as baterias da fortaleza de Angostura.

            O Marquês, na impossibilidade de um ataque frontal - seria rematada loucura -resolve desbordar pela esquerda, mandando construir uma estrada de mais de 13 quilômetros em meio altamente pantanoso e sujeito a escaramuças dos paraguaios. A idéia do Marquês é simples e óbvia: i) entrosar-se com e liberar a esquadra que estava sem meios de locomover-se no Rio Paraguai e ii) desembarcar mais ao norte e atacar, à la Maginot, a fortaleza de Angostura pela retaguarda, desbaratando o exército e Lopez, e partindo, então, para Assunção, com a guerra, virtualmente, terminada.

            A construção da estrada demorou 23 dias e deslocou 18667 homens na retaguarda de Solano Lopez. Se demorasse mais uns dias, o rio teria alagado a estrada!

            Ao desembarcar em S. Antônio, a preocupação do Marquês era a de ocupar a ponte de somente três metros mas de barrancas altas do arroio de Tororó, pela sua importância estratégica. O Visconde de Itaparica, contudo, diz-lhe que os paraguaios tinham chegado primeiro.

            No dia seguinte - 6 de dezembro - é promovido o ataque e, depois de 3 investidas das tropas brasileiras e 3 recuos, a situação começava a se tornar perigosa, pois, Fernando Machado pagara com a vida; Argolo e Gurjão, com ferimentos graves. A tropa começa a ceder e a recuar em desordem, quando o velho Marquês de 65 anos, desembainha a sua espada e solta o grito que eletrizou a soldadesca: Sigam-me os que forem brasileiros!

            O entusiasmo de Caxias foi o fator essencial para a passagem de Itaroró.

            Agora, o Marquês resolve aproveitar a surpresa estratégica e deslocar-se, com o máximo de velocidade, para o sul em direção ao outro arroio: o Avaí. Aqui, o espaço permite o movimento, os lances da cavalaria, em suma, a manobra que era o forte do Marquês. Divide, pois, o exército nas três alas clássicas: centro, direita e esquerda e a batalha se inicia com violência inaudita. No fragor da embate, desaba um temporal de proporções dantescas, tornando o quadro ainda mais grandioso. Se Itororó fora o cenário ideal para a infantaria, Avaí será a epopéia da cavalaria. Os planos do Marquês seguiam a sua trajetória meticulosa, quando, no final da manobra de envolvimento, Osório é ferido e os soldados começam a recuar, e mais uma vez, o Marquês resolve intervir diretamente no ataque, desembainhando a espada e lançando-se à frente dos soldados, restabelecendo o ímpeto ofensivo. Entre meio dia e a uma da tarde de 11 de dezembro, a batalha teve o seu desfecho favorável aos Aliados.

            Vencidos os obstáculos de Itororó e Avaí, o Marquês tinha, agora, diante de si, dois objetivos: atacar Angostura pela retaguarda ou investir agressivo sobre o exército inimigo. Escolheu o segundo. A idéia da manobra era a seguinte: isolar a fortaleza, atacar Pequiciri pelo norte e pelo sul e desfechar contra Ita-Ivaté, o reduto de Lopez, o ataque final com todas as suas forças. Em 21 de dezembro de 1868 tem início o combate em todas as frentes de Lomas Valentinas. A batalha deverá durar vários dias e terminará em 27 de dezembro. O combate é encarniçado, pois o inimigo detém fortíssimas posições dominantes. Os dois exércitos, no meio do enfrentamento, são separados por um temporal a exemplo de Avaí. No dia 22 e 23 chegam ao campo de batalha as forças argentinas, orientais e a brigada Paranhos. No dia 24, o Marquês envia um ultimato a Lopez, que é rejeitado. Caxias passa os dias 25 e 26 em preparação para o assalto final. No dia 27 rompe o fogo em todas as frentes num violentíssimo combate e a batalha é vencida pelos aliados. Todo o exército paraguaio foi destruído, mas o ditador conseguiu fugir. Angostura se rendeu no dia 30 de dezembro.

            No começo do ano de 1869, o Marquês envia o coronel Hermes da Fonseca para ocupar Assunção. Quatro dias depois estará em Assunção para dirigir a ocupação militar. A população do país tinha sido reduzida a frangalhos.

            Após um Te-Deum na capital dos paraguaios, acompanhado de todo o Estado-Maior, o Marquês sofre uma síncope, que dura meia hora. Contava, então 66 anos e o esforço inaudito dos dois últimos anos foram sobre-humanos. Resolvem, então, embarcar o Marquês para a Corte no dia 22 de janeiro. Chega ao porto do Rio de Janeiro no dia 15 de fevereiro, onde não há nenhum representante, seja do Ministro da Guerra, seja do Conselho de Ministros, seja do Senado do Império e muito menos do Imperador. O Marquês desembarca em melancólica solidão.

            A 23 de março de 1870 recebe o título de Duque. Em 1874 falece a Duquesa e Caxias realiza seu testamento. Em junho de 1875, o Imperador, desejando fazer uma longa viagem pelo mundo, convida o Duque para presidir o Conselho e ocupar, pela terceira vez, a pasta da Guerra. Em dezembro, em plena efervescência da "questão religiosa", o Duque consegue do Imperador, que não era muito favorável, um decreto concedendo anistia aos bispos envolvidos na cognominada Questão Religiosa. O Imperador parte em viagem, deixando a Princesa Isabel como regente do Trono.

            No final de 1877, ao regressar, o Imperador demite o Gabinete e nomeia, no dia 5 de janeiro de 1878, o Gabinete liberal de Sinimbu. O Duque de Ferro, desgostoso, refugia-se na fazenda Santa Mônica, onde permanecerá até a sua morte em 7 de maio de 1880. No dia seguinte, o corpo é conduzido para o Rio de Janeiro, onde é enterrado no dia 10, no Cemitério do Catumbi. E, no dizer do historiador, "segue-se o cortejo fúnebre, uma fila tão grande de carruagens que, quando a primeira chegou ao cemitério do Catumbi, ainda havia carros que não tinham saído do palacete da Tijuca. É o maior enterro da época"([5]).

            Morre o Condestável do Império, nasce o Herói da Nacionalidade e Patrono do Exército Brasileiro.

 

 

III - OS PRIMÓRDIOS E O CONTEXTO OBEDIENCIAL

            Para se tentar situar o Caxias maçônico tem-se que traçar, antes, os primórdios da maçonaria no Brasil e o contexto obediencial da época.

            O primeiro clube, com ares maçônicos, apesar de ser freqüentado, também, por profanos, do qual se tem notícia, no Brasil, foi fundado em 1796, em Pernambuco e denominava-se Areópago de Itambé. Segundo o Aurélio, areópago significa tribunal ateniense, assembléia de magistrados, sábios, literatos, etc. Teve como fundador e alma inspiradora o ex-frade carmelita e médico formado pela Faculdade de Monpellier na França, Arruda Câmara. Convém salientar que o grosso da elite, forjadora da independência brasileira foi formada em Coimbra e, o restante, em Monpellier. Enquanto os formados em Coimbra tinham, em termos médios, uma postura mais conservadora, os de Monpellier, talvez, por sofrerem o influxo das idéias iluministas dos enciclopedistas franceses, possuíam uma atitude mais radical, seja em termos liberais ou até mesmo republicanos.

            A primeira loja maçônica brasileira surgiu em águas territoriais brasileiras, no início de julho de 1797, na fragata francesa La Preneuse (A Apresadora), comandada por Larcher, onde aconteceram as primeiras reuniões. A 14 de julho, numa espécie de comemoração da Revolução Francesa, os notáveis da terra, como Cypriano Barata, José da Silva Lisboa, Francisco Muniz Barreto, padre Francisco Agostinho Gomes, Ignácio Bulção, José Borges de Barros, Domingos da Silva Lisboa, tenente Hermógenes de Aguiar Pantoja, mais o comandante Larcher fundaram em terra a Loja Maçônica Cavaleiros da Luz, na povoação da Barra, na Baía. 

            A primeira loja maçônica regular do Brasil, contudo, foi a Loja Reunião, fundada em 1801, no Rio de Janeiro e filiada ao Or\da Ilha de França, antigo nome da Ilha Maurício, situada no Oceano Índico e, na época colônia francesa.

            O Barão do Rio Branco, contudo, nos seus escritos fala de uma loja que teria existido em Niterói em 29 de julho de 1800, que poderia ter sido uma antecessora da Reunião e, apesar de não citar o nome da loja, supõe-se ter sido a loja União.

            A primeira obediência brasileira foi o Grande Oriente Brasiliano (ou Brasílico), fundado em 17 de junho de 1822 e teve como seu primeiro Grão-Mestre o Ir\ José Bonifácio de Andrada e Silva. Como filho espiritual do Grande Oriente de França, adotou o rito moderno ou francês. Castellani afirma que "criado nas asas dos ideais emancipadores e libertários, que empolgavam os brasileiros, nos primeiros anos do século XIX, o GRANDE ORIENTE DO BRASIL, a partir das três Lojas que lhe deram sustentação inicial e apesar de alguns percalços, não parou mais de crescer e de acolher homens de valor e de destaque nas letras, nas artes, nas ciências e nas armas do Brasil, os quais teriam atuação marcante em muitos episódios sociais e políticos do país, a ponto de se poder dizer, sem medo de errar, que não se pode escrever a História do Brasil independente, sem entrar na História do GRANDE ORIENTE DO BRASIL"([6]).

            As disputas políticas de José Bonifácio e Joaquim Gonçalves Ledo em relação ao monarca e ao processo de independência levam, este último, a convidar D. Pedro a ingressar na maçonaria. Em 2 de agosto, na nona sessão do Grande Oriente Brasiliano, D. Pedro foi iniciado como aprendiz e tomou o nome de Ir\ Guatimozim. Um costume da época grafava o nome dos obreiros com nomes históricos ou heróicos. Na décima sessão no dia 5 de agosto o Ap\ Guatimozim foi exaltado a M\M\. No dia 4 de outubro, na décima-sétima sessão, o Ir\ Guatimozim prestou juramento e foi empossado como Grão-Mestre da Obediência. Por brigas internas, D. Pedro mandou encerrar o Grande Oriente a 25 de outubro, permanecendo fechado por 10 anos.

            A partir de meados de dezembro de 1830, os maçons pertencentes aos corpos legislativos começaram a abrandar as leis que proibiam reuniões de sociedades secretas e após a abdicação de D. Pedro, em 7 de abril de 1831, a maçonaria começava a ressurgir. Os remanescentes do Grande Oriente Brasiliano, a partir de outubro de 1831, juntamente com seu ex-Grão-Mestre José Bonifácio, começaram a reunir-se, até que fosse concluída a Constituição do Grande Oriente do Brasil, daqui em diante denominado GOB. A reinstalação do GOB se deu em 23 de novembro de 1831. Com a reinstalação, os nomes heróicos ou históricos, tradição das lojas do rito adoniramita, que não mais existiam, a partir de uma resolução do GOB em dezembro de 1831, caíram em desuso.

            Como se não bastassem as brigas de José Bonifácio e Ledo, nos primórdios da independência, antes da reinstalação do GOB já havia surgido um outro Grande Oriente, denominado Grande Oriente Nacional Brasileiro, ou mais conhecido como Grande Oriente do Passeio, daqui em diante denominado GOP, fundado em 1830 e instalado em 24 de junho de 1831 e que teve como seu primeiro Grão-Mestre, o Senador Vergueiro aquele que, conjuntamente ao pai de Caxias e ao Marquês de Caravelas, fazia parte da Regência Trina Provisória. O Senador, anos mais tarde, viria a fazer parte do GOB. Agora, toda a luta se dará em função de quem seria o legítimo sucessor do Grande Oriente Brasiliano, fechado por D. Pedro no final de outubro de 1822, o GOB ou o GOP? Esta luta durará até 1861 quando abateu colunas o GOP e Caxias, como se verá adiante, teve um papel saliente  neste evento. Apesar de o GOB tentar, em 2 de abril de 1832, estabelecer contatos para uma fusão das duas obediências, que acabou fracassando, o quadro ia se tornando cada vez mais complexo e conflitivo. Tais conflitos políticos, no nascedouro do sistema obediencial brasileiro, concorreram, e muito, para que a maçonaria proibisse a discussão de temas políticos em lojas, desde então.

            Outro fator que, também, acirrou o conflito foi a fundação de uma terceira obediência em 12 novembro de 1832: o Supremo Conselho do Grau 33 do Rito Escocês Antigo e Aceito, introduzido no Brasil por Francisco Gê Acayaba de Montezuma, com patente fornecida pelo Supremo Conselho dos Países Baixos e que começou a proliferar, no Brasil, a partir de então. Montezuma era filiado tanto ao GOB quanto ao GOP e a introdução do seu Conselho, que é o legítimo no Brasil, criou, na época, uma série de oficinas híbridas, misturando graus simbólicos com altos graus filosóficos, estabelecendo um sincretismo e uma parafernália ritualística que a maçonaria brasileira sofre suas decorrências, principalmente no simbolismo, até os dias atuais. Como exemplo sintomático, cita-se o caso do velho Andrada, que Grão-Mestre de uma obediência de linha moderna ou francesa, recebe em 5 de março de 1833 o grau 33 do R.E.A.A.!

            Como o GOB adotava o rito moderno ou francês, o GOP resolveu, a partir do final de 1834, que suas lojas adotariam o R.E.A.A. Com a confusão pairando entre as lojas, resolveu o GOB publicar um Regulador do Rito Francês e o GOP um Guia dos Maçons Escoceses. Ainda em 1834, também, é fundado o primeiro Capítulo Rosa-Cruz do Rito Escocês. Em 1835, estrutura-se o  Soberano Capítulo do Rito Francês ou Moderno e, em 1836, o Ilustre Conselho de Kadosh Nº 1. Em 16 de janeiro de 1838 uma loja de Niterói do GOB - Sabedoria e Beneficiência - instala o rito adoniramita que não era praticado no Brasil e no mundo a vários anos.

            A década de 30 será conturbada não só para o Brasil como para a maçonaria, pois assistirá, às lutas políticas como um reflexo da fragilidade da regência que, inclusive, levam, à prisão, o Grão-Mestre José Bonifácio, tutor do Imperador. Uma perene troca de lojas de uma obediência para outra, de um rito para outro, conturbam, ainda mais, a maçonaria recém-reinstalada.

            As eleições para o Grão-Mestrado do GOP, em novembro de 1836, sufragam o futuro Marquês de Sapucaí. Quanto ao GOB, José Bonifácio é reeleito em 1837, mas vem a falecer em 6 de abril de 1838, entregando o Grão-Mestrado ao futuro Visconde de Albuquerque - o pernambucano Antônio Francisco de Paula Holanda Cavalcanti de Albuquerque que, após sucessivas reeleições, permaneceu, no cargo, até 1850. Ainda em 1838, o GOB criou um Grande Colégio de Ritos em lugar dos Capítulos, regulamentando, assim, o R.E.A.A., apesar de seu rito oficial continuar sendo o Moderno ou Francês.

            Os maçons das três Obediências - GOB, GOP e Supremo Conselho - lutavam e participavam da luta política da nação emergente. Com a Regência permanente, a luta começa a transformar-se em agitação, e o embate entre os maçons José Bonifácio (GOB) e o Padre Diogo Antônio Feijó (GOP)([7]) causam queda de ministérios e ataques no Parlamento. Existiam, também, maçons nas três facções em luta: restauradores, moderados e exaltados. Com a morte de D. Pedro I a luta se trava, agora, entre conservadores e liberais. Pelo Ato Adicional à Constituição de 1824, foi eleito, em 1835, como Regente Uno, o liberal maçom do GOP Padre Feijó que disputou e ganhou do maçom Holanda Cavalcanti e, como visto acima, futuro Grão-Mestre do GOB. Feijó que governará até 1837, quando é substituído pelo conservador Araújo Lima, tinha uma relação estreita com Caxias como se verá, futuramente, na revolução liberal de 1842 em S. Paulo. Araújo Lima deveria governar até 1842, quando em 23 de julho de 1840, sofre um rude golpe dos liberais, com a antecipação da maioridade de D. Pedro II e a conseqüente formação do gabinete da Maioridade ou das Famílias (oligarquias).

            No sul, estoura em 1835 a revolução Farroupilha que durará até 1845, quando é pacificada por Caxias, e que contava com ativíssima participação de maçons: Bento Gonçalves, David Canabarro, Giuseppe Garibaldi e tantos ou-tros.

            Também em outubro de 1835, o Supremo Conselho resolveu demitir Montezuma do cargo de Soberano Grande Comendador e nomear, em seu lugar, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, e como adjunto o seu irmão carnal José Bonifácio, que era Grão-Mestre do GOB, ligando, assim, momentaneamente, as duas obediências independentes. Outro golpe viria a sofrer o Supremo Conselho, em novembro de 1836. Com o agravamento do estado de saúde de José Bonifácio, alguns membros do Conselho resolveram tomar o poder ou dissolvê-lo para criar outro em seu lugar. José Bonifácio, ainda acamado, decidiu, por decreto de 10 de abril de 1837, expulsar o grupo rebelde, liderado por Cândido Ladislao Japiassu, que, em troca, forma um Supremo Conselho irregular.

            Com a morte de José Bonifácio, em 1838, é nomeado Soberano Grande Comendador o Conde de Lages - João Vieira de Carvalho - uma espécie de Austragésilo de Athaíde, pelo longo período que presidiu o Conselho, pois governará, ininterruptamente, até 1847, ficando o Supremo Conselho, neste época, conhecido como o Supremo Conselho do Conde de Lages. Ainda, neste ano, tentou-se, mais uma vez, unificar as três obediências, com resultados frustantes.

            No final de 1842, o Conde de Lages conseguiu a façanha de fundir o Supremo Conselho com o GOP, rejuvenescendo, assim, as duas obediências que estavam em processo de exaustão.

No tocante ao GOB, em 1842, obtém o reconhecimento do Grande Oriente da França e, com a sua nova Constituição, de feição mais liberal, começava a esvaziar o GOP. Neste mesmo ano, reorganiza o Grande Colégio de Ritos (Moderno ou Francês, Adoniramita e Escocês), adaptando-o à nova constituição e passam a ocupar o prédio do Lavradio, velha aspiração dos maçons do GOB.

            Durante o ano de 1845, o GOB conseguiu, com a decadência evidente do GOP, firmar tratados de amizade e reconhecimento com as seguintes obediências estrangeiras: Grande Loja de Nova York, Grande Loja da Prússia e Grande Loja de Hamburgo.

            O quadro geral apresentava, desta maneira, um GOB regular e em crescimento, um GOP irregular e decadente em fusão com um Supremo Conselho legítimo, mas em processo de esvaziamento.

            Em 1846 um rude golpe concorre para abalar o GOP: seu Grão-Mestre, o futuro Marquês de Sapucaí em conflito com o Grande Secretário Brito Sanches e postulante ao Grão-Mestrado, entregava o cargo e, com diversos elementos do GOP e do Supremo Conselho, que ainda era dirigido pelo Conde de Lages, ingressava no GOB. Brito Sanches conseguia, assim, acelerar o processo de implosão do GOP.

            Com a saída do Marquês de Sapucaí assume o Grão-Mestrado do GOP o senador Manoel Alves Branco que, obviamente entrou, também, em conflito aberto com Brito Sanches, que saiu para fundar uma nova obediência e um novo Supremo Conselho. "Diante disso, o conde de Lages, já doente e sem condições de enfrentar essa dura batalha, entregou a direção do Supremo Conselho LEGÍTIMO a Luiz Alves de Lima e Silva, o conde de Caxias, o qual, pelo prestígio de que já desfrutava, era quem poderia salvar a situação. Caxias, então, tomando posse como Soberano Grande Comendador do Conselho, declara-se independente, saindo da sede - então na rua do Conde - e mantendo o título que a Obediência possuía desde a fusão de 1842, ou seja, Muito Poderoso Supremo Conselho do Rito Escocês Antigo e Aceito do Grande Oriente Brasileiro, já que esse título não fora extinto pelo Passeio, quando da criação de seu Supremo Conselho espúrio. Caxias tornava-se, assim, além de Soberano Grande Comendador, Grão-Mestre desse Grande Oriente, que costuma ser tratado, pelos historiógrafos, como "Grande Oriente de Caxias". A Obediência perduraria até 1852, quando foi feita a sua fusão com o Grande Oriente do Brasil"([8]).

            Em 1846, portanto, existiam, no Brasil, as seguintes obediências: i) GOB de Holanda Cavalcanti (regular), ii) GOP de Alves Branco (irregular), iii) Grande Oriente de Brito Sanches (irregular), iv) Grande Oriente de Caxias (irregular), v) Supremo Conselho de Caxias (legítimo), vi) Supremo Conselho de Japiassu (ilegítimo), vii) Supremo Conselho de Brito Sanches (ilegítimo).

            Em 9 de setembro de 1850 toma posse no GOB o futuro Marquês de Abrantes - o baiano Miguel Calmon du Pin e Almeida - que promoverá, em 1852, a fusão do Grande Oriente de Caxias e do Supremo Conselho com o GOB.

            Enquanto o GOB florescia, o GOP chegou a contar com somente 10 lojas em 1857! Com a renúncia, ao Grão-Mestrado do GOP, de Alves Branco, em 1856, assume o Visconde do Uruguai - Paulino José Soares de Souza - que, com um seleto grupo, passará, também, para o GOB no início de 1861.

            A partir de meados do século o grande debate será o abolicionismo, no qual a maçonaria exercerá um papel de relevo. A “lei Aberdeen” na Grã-Bretanha, promulgada sob os auspícios da Grande Loja Unida em 25 de março de 1845, determinava que todo navio brasileiro que transportasse escravos poderia ser apresado por navio inglês. Como resposta à crescente pressão britânica, o governo brasileiro promulgou a lei do maçom Eusébio de Queiroz, extinguindo o tráfico de escravos, em 4 de setembro de 1850.

            Desde 1861 até 1863, quando houve a absorção definitiva pelo GOB do GOP, reinava, finalmente, a paz na maçonaria brasileira. Ao invés de solidificar a pacificação, a trégua durou muito pouco, pois, no mesmo ano, surge, novamente, outra grave cisão: a criação do Grande Oriente do Brasil do Vale dos Beneditinos, daqui em diante denominado de Grande Oriente dos Beneditinos. O grupo dissidente, liderado por Saldanha Marinho, criou tais tipos de problemas que forçaram a renúncia do Marquês de Abrantes em 25 de agosto de 1863, sendo substituído pelo Grão-Mestre Adjunto Bento da Silva Lisboa, Barão de Cayru, posteriormente aclamado novo Grão-Mestre do GOB em 25 de novembro. O ano de 1864 assiste aos manifestos de Saldanha e de Cayru, explicando ambas as posições. A 26 de dezembro, Cayru falece, sendo substituído pelo Grão-Mestre Adjunto, Joaquim Marcelino de Brito, que foi eleito em 26 de abril do ano seguinte.

            Em 1869, influenciados pelo Grande Oriente Lusitano Unido que acabava de se unificar, Saldanha propõe a Marcelino a reunificação das duas obediências. O processo de reunificação dura até abril de 1871, quando as eleições concorrem para implodí-lo. Ainda em 1871, toma posse em março, o Visconde do Rio Branco como Grão-Mestre do GOB. O Visconde fazia parte do Conselho de Estado, tinha assinado o tratado de paz com o Paraguai e seu gabinete foi o de mais longa duração de toda a história do Império, pois durou de 7 de março de 1871 (alguns dias antes de assumir o Grão-Mestrado) até 25 de julho de 1875. Seu maior feito foi a promulgação da lei Visconde do Rio Branco, ou, como é popularmente conhecida, lei do Ventre Livre a 28 de setembro de 1871.

            No início da década de 70 o movimento abolicionista começa a se imbricar com o movimento republicano, e a maçonaria exerceu profunda influência em ambos.

            A lei Visconde do Rio Branco, também, serviu para desencadear uma crise entre o alto clero e o governo imperial, na qual as duas obediências maçônicas foram envolvidas: a Questão Religiosa. O fulcro da contenda foi um discurso pronunciado pelo Grande Orador Interino do GOB - padre José Luiz de Almeida Martins - enaltecendo a Maçonaria e seu Grão-Mestre, o Visconde, pela abolição gradual da escravidão no Brasil. Com a publicação, no dia seguinte, do discurso pelos principais diários da Corte, o bispo do Rio de Janeiro - D. Pedro Maria de Lacerda - advertiu o padre e exigiu a sua saída da maçonaria. O padre se recusou e o bispo o suspendeu das ordens. Estava desencadeada a crise política que acabou por envolver D. Antônio de Macedo Costa, bispo do Pará e D. Vital de Oliveira, bispo do Recife. A crise perduraria até a formação do gabinete de Caxias, quando ele consegue, apesar da relutância do Imperador, anistiar os bispos pelo decreto imperial nº 5.993 de 17/09/1875. 

            A Questão Religiosa reacendeu, na maçonaria, a discussão sobre o processo de reunificação. Em 4 de junho de 1872, aprovaram-se os termos de um acordo para se organizar um Grande Oriente Unido, que fundisse o GOB com o dos Beneditinos. Foram realizadas várias eleições, ora elegendo o Visconde do Rio Branco, ora Saldanha Marinho, com impugnações de ambos os lados e brigas homéricas. Dado o impasse, os maçons do GOB retornaram à sua grei, tendo o Visconde reassumido o Grão-Mestrado do GOB, enquanto Saldanha Marinho e seu Grande Oriente dos Beneditinos se apossavam do Grande Oriente Unido do Brasil.

            Em 18 de abril de 1873, era realizado em Itu, na Província de S. Paulo, a primeira Convenção Republicana do Brasil e, mais uma vez, a maçonaria se fazia presente, pois, os principais líderes eram maçons.

            Castellani afirma que "no Grande Oriente do Brasil, em 1873, o Sublime Grande Capítulo dos Ritos Azuis (Moderno e Adoniramita), que sucedera ao Grande Colégio de Ritos, quando este perdera o Rito Escocês, com a incorporação do Supremo Conselho, em 1855, ficava reduzido ao Rito Moderno, já que, a 24 de abril daquele ano, pelo decreto Nº 21, era criado o Grande Capítulo Noachita, Oficina Chefe da Maçonaria Adoniramita. Só a 23 de novembro de 1874 é que desapareceria o Grande Capítulo dos Ritos Azuis, com o surgimento do Grande Capítulo Geral do Rito Moderno, Oficina Chefe do rito"([9]).

            O infausto ano de 1880 assiste a duas mortes célebres: a de Caxias em 7 de maio e a do Visconde do Rio Branco em 1º de novembro.

 

 

IV - SINOPSE MAÇÔNICA DE CAXIAS

            Apesar de existirem inúmeras biografias do Caxias profano, somente se encontra um trabalho sério sobre o Caxias maçônico: o de Kurt Prober, citado na Introdução deste estudo.

            Kurt chega, mesmo, a afirmar que "biografias de CAXIAS, quer sobre a sua vida profana, militar ou política, existem às centenas, mas por curiosa coincidência, o seu primeiro biógrafo, o Monsenhor Pinto de Campos, sacerdote pernambucano, e que escreveu sobre a vida de Caxias em 1878, enquanto vivo ainda, esquiva-se de qualquer alusão maçônica, apesar de ter sido ele um maçom bastante ativo no passado. Ao leitor desavisado de hoje, este fato por certo causará estranheza, mas as condenações da Santa Sé, já então postas em vigor no Brasil, durante a famigerada "Questão Religiosa", tornam tudo perfeitamente plausível, pois afinal de contas o sacerdote "não queria perder o seu emprego"...

            A bem da verdade deve aqui ser mencionado, que a magnífica conferência proferida pelo Marechal Augusto da Cunha Magessi, em 25.8.1965, também não faz qualquer referência a vida maçônica de Caxias, cousa muito natural uma vez que o conferencista NÃO era maçom, e sim convidado de honra"([10]).

            Tudo leva a crer que o pai do Ir\ Caxias - Francisco de Lima e Silva -  não deve ter sido maçom, contudo, o seu  tio -  José Joaquim de Lima e Silva, Visconde de Magé - era maçom de destaque e ativo ali pelos idos de 1831 a 1834. Muitos escritores, notadamente maçônicos, confundiram o Ir\ Caxias com o seu tio. "Por sinal este parentesco talvez possa tornar compreensível a..."atitude INEXPLICAVEL..." do futuro Ir\ CAXIAS no caso do maçom MIGUEL DE FRIAS, na ABRILADA, fato tão comentado por Gustavo Barroso, inimigo fidagal da Maçonaria.

            NÃO PRENDENDO.. Miguel de Frias, Luiz Alves provavelmente assim agiu em atenção ou mesmo por ordem de seus superiores hierárquicos JOSÉ JOAQUIM e MANOEL DA FONSECA, seus tios e talvez, quem sabe, mesmo por ordem do próprio Regente Feijó, o que por sua vez iria explicar o fato, de CAXIAS NÃO TER PRENDIDO FEIJÓ ao ter ocupado Sorocaba em 1842"([11]).

            Inexistem, até os dias de hoje, provas documentais sobre a loja e a data onde o profano Caxias teria sido iniciado. "Embora não haja documentação "oficial" sobre o ingresso de CAXIAS na maçonaria e sobre sua atividade maç\ antes de 1847, pelo menos até agora não apareceu, é isto uma circunstância perfeitamente explicável, pois, sendo ele católico praticante, posteriormente muita "gente boa" tinha todo o interesse em fazer desaparecer qualquer vestígio de ter ele pertencido à Ordem"([12]).

            Prober supõe que Caxias deve ter sido iniciado numa loja do GOP ou numa das três lojas do Supremo Conselho do Conde de Lages, antes da fusão de 1842, na Corte, entre 30 de junho de 1841 e 17 de maio de 1842, quando ainda era brigadeiro e Barão. "A iniciação com mais probabilidade se teria realizado na Loja S. PEDRO DE ALCANTARA, em 1842, sob o malhete do Dr. Thomaz José Pinto de Serqueira 33\ ...Poderiam ter sido os seus padrinhos: O próprio Conde de LAGES - João Vieira de Carvalho - que, sendo Ministro da Guerra, em 12.12. 1839 escolhera o então CORONEL LUIZ ALVES para pacificar a BALAIADA no Maranhão, ...Ou então ingressara pela mão de seu amigo dileto José Clemente Pereira, o Ir\ CAMARÃO, Ministro da Guerra..."([13]).

            Castellani, ao pinçar alguns traços biográficos de Caxias, afirma que "foi iniciado numa das Lojas do Grande Oriente do Passeio, integrando-se ao Grande Oriente do Brasil, a partir da fusão deste com o Supremo Conselho, em 1852"([14]).

            Em outubro de 1842, o Visconde de Albuquerque, na vida profana Ministro da Guerra e, na maçonaria, Grão-Mestre do GOB nomeia o Ir\ Caxias para acabar com a interminável rebelião Farroupilha. Quase todos os líderes da revolução dos Farrapos eram maçons, tanto que na bandeira Farroupilha aparecem as colunas maçônicas J\ e B\ e o Ir\ Bento Gonçalves chegou a ser Ven\ da Loja Filantropia e Liberdade de Porto Alegre. Os ideais maçônicos podem ser visualizados, tanto nos proclamas e manifestos de Caxias quanto no Manifesto da Paz de 28 de fevereiro de 1845, assinado pelo Ir\ David Canabarro.

            Ao voltar dos pacificados pagos do Sul, o Ir\ Caxias encontrou as lojas do Supremo Conselho incorporadas ao GOP pelo tratado de 4 de novembro de 1842. Assiste ao cisma perpetrado no GOP pelo Ir\ Brito Sanches, Marechal de Campo e Grande Secretário do GOP, que tendo sido derrotado pelo Ir\ Manoel Alves Branco para o Grão-Mestrado do GOP, resolve, como é praxe, em alguns momentos, na maçonaria brasileira, "criar" uma nova obediência. Com a eleição de Alves Branco, este resolve reclamar os seus direitos de Lug\ Ten\ do Supremo Conselho, com o que não concorda o alquebrado Conde de Lages.  Com a precária e caótica situação do GOP, o Conde de Lages denuncia o referido tratado de 1842 e nomeia Caxias seu sucessor. Kurt Prober apresenta um documento provando que a fundação do Supremo Conselho de Caxias e do Círculo Maçônico Independente deu-se a 20 de março de 1847, pois, "para poder desincumbir-se da FUNDAÇÃO  de seu Círculo Maç\ INDEPENDENTE o Conde de Caxias pediu licença do Comando das Armas da Côrte, o que conseguiu em 22.3.1847, só se apresentando da licença em 11 de Maio do mesmo ano, quando os trabalhos mais prementes da Instalação já tinham sido realizados"([15]).

            Castellani afirma que diante das desavenças "o Conde de Lages, já doente e sem condições de enfrentar essa dura batalha, entregou a direção do Supremo Conselho LEGÍTIMO a Luiz Alves de Lima e Silva, o conde de Caxias, o qual pelo prestígio de que já desfrutava, era quem poderia salvar a situação. Caxias, então, tomando posse como Soberano Grande Comendador do Conselho, declara-se independente, saindo da sede - então na rua do Conde - e mantendo o título que a Obediência possuía desde a fusão de 1842, ou seja, Muito Poderoso Supremo Conselho do Rito Escocês Antigo e Aceito do Grande Oriente Brasileiro, já que esse título não fora extinto pelo Passeio, quando da criação de seu Supremo Conselho espúrio. Caxias tornava-se, assim, além de Soberano Grande Comendador, Grão-Mestre desse Grande Oriente, que costuma ser tratado, pelos historiógrafos, como "Grande Oriente de Caxias". A Obediência perduraria até 1852, quando foi feita a sua fusão com o Grande Oriente do Brasil"([16]).

            Com a fundação de seu Oriente Independente, Caxias contou com pouquíssimas lojas, dentre as quais podem ser citadas: 23 de Julho, de Saquarema (RJ); 2 de Dezembro, União Escocesa e Triunfo do Brasil, todas do Rio de Janeiro; e 24 de Junho de S. Gabriel (RS).

            Um dos primeiros documentos que começam a aparecer sobre o Caxias maçônico, partir de 1847, foi o de uma solenidade  na Loja União Escocesa na qual se comemorava a posse do Conde de Caxias como Soberano Grande Comendador e Grande Inspetor do Grau 33. Convém salientar que, a hoje quase-sesquicentenária, ARLS União Escocesa é a Loja-Mãe do velho Kurt!

            Kurt apresenta um fac-símile deste libreto de 1847 com o seguinte título na capa: Discursos e Mais Peças D'Achitectura Recitada por Ocasião da Posse das Luzes e Mais Dignidades da Sempre Aug\ e Resp\ L\ Un\ Esc\ aos 26 dias do 5º mez da Verd\ L\ de 5847 e oferecidas AO SOB\ GR\ COMM\ INSP\ G\ 33\ CONDE DE CAXIAS.

            À página 18 do referido opúsculo, existe um soneto em honra à Caxias, que, por curiosidade maçônica, passo a apresentar:

 

                                                            S O N E T O

 

                                    Da brazilica gente heroe famoso

                                     Preclaro general, bravo guerreiro,

                                     Dos louros marciaes feliz herdeiro,

                                     E o sanct'elmo da paz mais assombroso;

 

                                    Do Parlamento ornato portentoso

                                     Em prol da Patria sabio e justiceiro,

                                     Cantar venho teu nome prazenteiro

                                     Brandindo a fraca lyra fervoroso;

 

                                    Da gran MAÇONERIA brilho e gloria,

                                     O illustre povo honras, que te venéra,

                                     Qu'a aureola te cingiu tão meritoria;

 

                                    A ESCOCEZA UNIÃO hoje se esméra

                                     Em teu nome inscrever na sua historia,

                                     Pois risonha lh'abriste propicia éra.

 

                                                Pelo Ir\Francisco Leal Passos

                                                                                    C\R\+

 

            Alguns meses de gestão e o Ir\Conde de Caxias começou a sentir a politicalha, a vaidade e os interesses pessoais que assolavam a maçonaria da sua época. "Naturalmente CAXIAS não era homem para viver num ambiente destes por muito tempo, e vendo a pasmaceira em que naturalmente também deve ter caido o SEU círculo, que fora obrigado a formar por mera força das circunstâncias, e talvez mesmo para atender ao pedido de um amigo moribundo, sentiu desde logo a necessidade de consolidar a posição do seu SUPREMO CONSELHO no Brasil, que necessariamente teria de funcionar aliado a uma potência maçônica vigorosa.

            Assim aproveitou a primeira oportunidade que vislumbrou para ver se conseguia fazer uma FUSÃO com o grêmio mais forte daquela época, então dirigido pelo Gr\ M\ Antônio Francisco de Paula e Holanda Cavalcanti de Albuquerque, cuja administração já demonstrava nítido cansaço, depois de continuamente reeleito desde 1837"([17]).

            Encarrega oficialmente, em julho de 1849, o Ir\João Fernandes Tavares a iniciar o processo de negociação com o GOB sobre a fusão do seu Supremo Conselho, o Conselho de Montezuma, o do Conde de Lages, em suma, o Supremo Conselho legítimo do Brasil.

            Kurt apresenta, durante a sua administração no Supremo Conselho, quatro documentos com a assinatura do Ir\ Caxias: i) o documento acima nomeando João Fernandes delegado junto ao GOB para tratar da fusão (17/07/49); ii) carta constitutiva da loja Perfeita Amizade do Rio de Janeiro (02/08/50); iii) carta capitular da mesma loja (16/09/50); iv) carta constitutiva da loja Piratininga de São Paulo (16/09/50).

            A fusão do Círculo Maçônico (espúrio) mais o Supremo Conselho (legítimo) de Caxias com o GOB só foi ultimada após a volta da campanha do Sul contra Oribe e Rosas, lá pelos meados de 1852.

            Os documentos oficiais sobre esta fusão, ainda, não foram encontrados, apesar de que "não existe motivo APARENTE para o fato de o GOB, nunca ter feito alarde - pelo menos até agora não apareceu UM ÚNICO DOCUMENTO OFICIAL - sobre esta FUSÃO, quando isto seria perfeitamente justificável, pois em última analise foi por ela que o GOB conseguiu o seu SUPREMO CONSELHO "REGULAR E LEGÍTIMO", que diziam existir, mas que nem de suas várias Constituições constava `de fato´"([18]).

            Aqui convém abrir um pequeno parênteses sobre as diversas Constituições do GOB, naquela época. A primeira Constituição do GOB, após a sua reinstalação, foi a de dezembro de 1832; a segunda entrou em vigor em 1º de setembro de 1839; a terceira, uma das mais liberais e tolerantes no intuito de atrair lojas do Passeio, foi sancionada em 12 de janeiro de 1842; a quarta, promulgada a de 15 de setembro de 1852, ano, também da fusão com o Supremo Conselho legítimo de Caxias, causou uma verdadeira celeuma, pois previa um mandato de cinco anos para a Alta Administração, criava o primeiro timbre do GOB, colocava fim às liberalidades da Carta de 1842, que permitia que o GOB fosse tomado de assalto por elementos perniciosos, muitos advindos do GOP, chegando mesmo a criar um Grande Oriente Revolucionário!; a quinta, a de 26 de fevereiro 1855, tentou por fim às contendas entre as Constituições de 42 e 52, pois algumas lojas seguiam a primeira e outras, a segunda, e teve o mérito de separar os ritos, "tendo destacado o Rito Escocês, com a incorporação do Supremo Conselho legítimo, trazido por Caxias. Assim, administrativamente, o Supremo Conselho passava a ser independente do Grande Oriente, o que não acontecia com os outros dois ritos - Moderno e Adoniramita - que ainda faziam parte do Grande Colégio de Ritos, que havia sido reorganizado por Manuel Joaquim de Menezes, em 1842. Assim, com a promulgação dessa nova Constituição, foi necessário liquidar com o Grande Colégio de Ritos e criar, para os ritos Moderno e Adoniramita, o Sublime Grande Capítulo dos Ritos Azuis, cujo Regulamento Geral seria aprovado a 7 de maio de 1858"([19]); a sexta Constituição promulgada em agosto de 1862; e, finalmente, a sétima, em 29 de abril de 1865, após a grande cisão que resultou no Grande Oriente dos Beneditinos de Saldanha da Marinho.

            Kurt Prober prova a fusão "por tabela", dada a inexistência de documentos oficiais. Alinhava dois documentos: i) o Manifesto do Grão-Mestre Provincial do Rio Grande do Sul - João Affonso de Freitas Amorim - que relata explicitamente a fusão do Grande Oriente do Brasil e do Supremo Conselho do Conde de Lages em 1852 e ii) o Manifesto do Barão de Cayru de 1864 que aborda a notícia, como um dos únicos documentos da época, da criação de um Grande Oriente Revolucionário, causado pela Constituição de 1852, que trazia nos seus artigos 333 e 334 a previsão de um Supremo Conselho, "prova mais do que convincente de que, se a fusão ainda não esta concluída, nesta altura dos acontecimentos estava para ser sancionada a qualquer hora, e de fato foi, por certo nos dias em que explodiu a revolta no GOB, como vimos do Manifesto de 1874"([20]).

            Já a Constituição de 1855 cita explicitamente, no seu artigo 2º, um Supremo Conselho do Rito Escocês Antigo e Aceito e no artigo 6º, que constará de 27 membros efetivos.

            Em 4 de novembro de 1856, numa das sessões do Supremo Conselho existe a comunicação de que o Marquês de Caxias tinha sido admitido como filiando-livre na Loja 2 de Dezembro, que desde 1853 trabalhava sob os auspícios do GOB.

            No ano de 1861, num documento do GOB sobre sua Organização e das Grandes Oficinas cita como cinco membros efetivos do Conselho os seguintes: Visconde de Albuquerque, Conselheiro Antônio da Veiga, Marquês de Olinda, Marquês de Caxias e Visconde de Sapucai.

            Outro grande mito que precisa ser desfeito é o de ter sido Caxias Grão-Mestre do GOB. Segundo Castellani "ao contrário do que afirmam alguns historiógrafos, Caxias NÃO FOI GRÃO-MESTRE DO GRANDE ORIENTE DO BRASIL, mas, sim, da Obediência oriunda da dissidência do Passeio, junto com o Supremo Conselho, a partir de 1847. Ele receberia, sim, depois de sua filiação ao Grande Oriente do Brasil, o título de Grão-Mestre de Honra da Obediência, o qual é simplesmente honorífico, não envolvendo exercício do cargo"([21]).

            A comprovação do título honorífico é apresentada por Prober, pois, "quanto ao fato de CAXIAS ter recebido o título de Gr\M\Honorário do GOB, não há dúvida, pois o seu nome consta como tal no "QUADRO GERAL DO GOB DO LAVRADIO", publicado em 1871, pg.8, e numa relação publicada no Boletim de 1874, pg. 354 (ref. 1874,301); entretanto, querer insinuar, que tenha recebido tal honraria em retribuição pela entrega do seu Supremo Conselho ao GOB é inadmissível, e não se coadunaria com o seu caráter. Também está errada a notícia dada no Bol. de 1956, pg. 56, onde se diz "que teria recebido o título em 1872", pois no ano anterior já o possuía"([22]).

            Em 1869, Caxias, já como Duque, foi nomeado representante do Supremo Conselho da Inglaterra no Grande Oriente do Brasil. Exerceu este cargo até a sua morte em 1880.

            Em 17 de setembro de 1875, D. Pedro II, contrafeito, assina o Decreto nº 5993 que anistiava os bispos no momentoso assunto da questão religiosa. A análise de Castellani sobre o padroado da época e a questão religiosa é muito percuciente, pois "o clero brasileiro era, tradicionalmente, recrutado em dois grandes celeiros: um era a Casa Grande das fazendas, onde as "sinhás", na sua superficial devoção, sonhavam ter um filho padre... o outro era a pequena burguesia, que fazia todos os esforços para mandar seus filhos para os seminários, pois esse era o meio para obter instrução gratuita e posição social, que a insuficiência econômica e a situação social não lhes permitiria ter de outra maneira. Assim, a história do clero brasileiro, no período imperial, mais do que as considerações de ordem espiritual, está ligada às de ordem econômico-social.

            Esse quadro acabaria por proporcionar uma superficialidade gritante na devoção do povo, que comparecia às cerimônias religiosas como se fosse participar de um folguedo, como relata Auguste de Saint-Hilaire, depois de assistir, em S. Paulo, às cerimônias de uma Semana Santa. Mais do que isso, propiciaria a instalação de um clero, que, muitas vezes, aproveitava-se do fanatismo gerado pela ignorância e que se adaptara à sociedade patriarcal, dando-se bem com o regime, usufruindo dos bens que possuía, sem grande propensão à teologia, e, por estar impregnado pelas superstições e crendices, tolerando-as e avivando-as no povo.

            Ao lado desse clero popular e desse peculiar catolicismo, entretanto, existia outro, formado por sacerdotes cultos, ciosos de seus princípios teológicos e do direito canônico, inconformados com as crendices populares, a religiosidade supersticiosa, o sincretismo religioso e o paternalismo imperial. Formando um bloco quase hermético, sem ligação com o povo e sua superficial devoção, esses poucos sacerdotes formavam a elite do clero, e seria essa elite que entraria em conflito com o governo imperial, dando origem à questão religiosa. Tanto isso é verdade, que o conflito foi ignorado pelo povo, não havendo nenhum movimento a favor dos bispos, nem mesmo por parte do clero, já que a maioria dos prelados e dos sacerdotes evitou, prudentemente - já que dependia do Estado - tomar partido na querela"([23]).

            O decreto de anistia fala em colocar os processos dos bispos, que tinham sido instaurados, em "perpetuo silêncio", dentro do espírito da visão pacificadora do Ir\ Caxias. Tal decreto alimentou, ainda mais, a impopularidade do Ir\ Caxias entre adeptos da Arte Real. Além disso, o Ir\ Caxias gerou mais impopularidade ao defender publicamente a manutenção da junção do Estado com a Igreja, tese radicalmente contrária a posição da maçonaria da época.               

            O decreto de anistia causou tal celeuma que o próprio Visconde do Rio Branco, ex-Grão-Mestre do GOB, preferiu deixar o Conselho de Ministros a ter de assiná-lo. Prober chega mesmo a afirmar que "D.Pedro não se enganara com o clero..., mas tinha encontrado o "bode" expiatório para a situação vexatória, que ele mesmo criara, e que por cima lhe agüentaria o galho enquanto por mais de DOIS ANOS iria passear na Europa"([24]). Kurt põe mais lenha na fogueira ao dizer que o Ir\, Caxias, também, recebeu "logo em seguida - em meiados de 1876 - a RETRIBUIÇÃO DO CLERO, ao ser EXPULSO, POR SER MAÇON, da IRMANDADE DA CRUZ DOS MILITARES DO Rio, confraria da qual tinha sido Provedor em 1871/72 e ainda era MEMBRO DA MESA ADMINISTRATIVA em 1876"([25]).

            Kurt termina o seu artigo relatando que a Igreja resolveu "esquecer" que o Ir\Caxias tinha sido maçom, pois, "ao serem trasladados o restos mortaes de CAXIAS, que no interim se tornara PATRONO DO EXÉRCITO, do Cemitério de Catumbi, Rio, para o PANTHEON MILITAR, em frente ao Quartel General do Exercito, foi justamente na Igreja da Irmandade da Cruz dos Militares, na antiga rua Direita, que o expulsara como MAÇON PESTILENTO, realizada a vigilia civica da eça armada, das 12 horas do dia 24 até 8 horas de 30.08.49.

            Participaram da trasladação dos ossos do MAÇON CAXIAS nada menos do que 18 bispos e arcebispos de todos os rincões brasileiros, sendo a missa rezada por Dom Jorge Marcos de Oliveira, na presença de D. Jaime de Barros Câmara.

            A maçonaria não esteve representada OFICIALMENTE no ato, mas salvou a situação pelo menos a presença do Presidente da Comissão de Trasladação, o maçon Dr. NEREU RAMOS, então Vice-Presidente da República, e o maçon Capitão-Médico TITO ASCOLI DE OLIVA MAIA, sendo que este ultimo assinou a ATA DA EXHUMAÇÃO EM 23.8.1949"([26]).

            Se a Igreja esqueceu que Caxias foi maçom, parece que o mesmo aconteceu com a maçonaria. E a barretada final de Kurt Prober na maçonaria não pode deixar de ser citada:

            "Os boletins do GOB de 1880 estavam por demais ocupados com a Assembléia Constituinte, e em noticiar o falecimento da filha do Visc. do Rio Branco, e já em 1.11.1880 o passatempo do proprio VISCONDE, de modo que não houve espaço para siquer mencionar a morte do seu GRÃO-MESTRE HONORÁRIO, que lhe entregara graciosamente o SUPREMO CONSELHO LEGÍTIMO"([27]).

            Sic transit gloria mundi!

 

 

V - CONCLUSÃO

            Se a ingratidão foi uma constante, em determinados períodos, da vida do Ir\ Caxias, seja dos políticos, do Imperador, ou da maçonaria, cabe, agora, as gerações posteriores redimir este hiato.

            A ARLS Duque de Caxias nº 2589 e o Centro de Estudos Maçônicos do mesmo nome tem o dever de pesquisar, com mais profundidade, o Caxias Maçônico, não só para as futuras gerações, como também para os maçons de hoje que, com raríssimas exceções, desconhecem a figura maçônica do Duque de Ferro.

            Além da pesquisa, propriamente dita, a referida Loja deveria atualizar, periodicamente, o catálogo das Lojas com o nome do Duque, não só no GOB, como nas Grandes Lojas, nos Orientes Independentes e nos Corpos Filosóficos, para que se possa estabelecer um intercâmbio de idéias sobre Caxias e uma troca de experiências.

            A filatelia e a numismática sobre o Duque de Caxias, também, precisa ser estudada, pesquisada e preservada.

            A promoção de estudos de divulgação de Caxias, principalmente, para as crianças em idade escolar parece ser de bom alvitre.

            As datas memoráveis de Caxias não deverão passar em branco, principalmente, nas lojas que ostentam o seu nome.

            Que esta pequena monografia sirva de incentivo para que a maçonaria e as lojas portadoras de seu imortal nome cultivem o seu glorioso passado.

 

 

VI - BIBLIOGRAFIA

 

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[1] CARVALHO, Afonso de,  Caxias,  Bibliex,  Rio  de  Janeiro, 1976, pg. 62.

[2] CARVALHO, opus cit., pg. 109.

[3] CARVALHO, opus cit., pg. 203.

[4] CARVALHO, opus cit., pg. 162.

[5] CARVALHO, opus cit., pg. 293.

[6] CASTELLANI, José, História do Grande Oriente do Brasil - A Maçonaria na História do Brasil, Gráfica e Editora  do  Grande Oriente do Brasil, 1993, pg. 15.

[7] Feijó foi iniciado na loja Amizade fundada em 1832, a  segunda da Província de S. Paulo e filiada ao GOP.

[8] CASTELLANI, José, História do Grande Oriente do Brasil - A Maçonaria na História do Brasil, Gráfica e Editora  do  Grande Oriente do Brasil, 1993, pg. 123.

[9] CASTELLANI, opus cit., pg. 156.

[10] PROBER, Kurt, Duque de Caxias - Sua  Vida  na  Maçonaria,  ed. do autor, Rio de Janeiro, 1972, pg. 6.

[11] PROBER, opus cit., nota 3, pg. 6.

[12] PROBER, opus cit., pg. 13.

[13] PROBER, opus cit., pg. 8.

[14] CASTELLANI, opus cit., pg. 126.

[15] PROBER, opus cit., pg. 15.

[16] CASTELLANI, opus cit., pg. 123.

[17] PROBER, opus cit., pg. 19.

[18] PROBER, opus cit., pg. 26.

[19] CASTELLANI, opus cit., pg. 132.

[20] PROBER, opus cit., pg. 27.

[21] CASTELLANI, opus cit., pg. 126.

[22] PROBER, opus cit., pg. 29.

[23] CASTELLANI, opus cit., pg. 158.

[24] PROBER, opus cit., pg. 33.

[25] PROBER, opus cit., pg. 34.

[26] PROBER, opus cit., pg. 36.

[27] id. ibidem., pg. 36.