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MONOGRAFIAS MAÇÔNICASpelo Ven.Irmão WILLIAM ALMEIDA DE CARVALHO 33SEXO, ESPIONAGEM E MAÇONARIA NA VELHA ALBION
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I - Introdução
Um assunto pouco estudado na literatura maçônica é o Clube do Fogo do
Inferno (Hell-Fire Club) na Inglaterra do século XVIII. Os estudiosos ingleses,
como Robert F. Gould, na sua obra clássica, no passado e John Hamill no
presente, não abordam o assunto seja por pudor ou por manter uma aura de
sacralidade nos assuntos referentes à arte real. Quando muito falam do Duque de
Wharton, visto não ter como escamoteá-lo pois foi o sexto Grão-Mestre da
Grande Loja da Inglaterra. Os norte-americanos desconhecem o assunto e os
franceses estão mais preocupados com seu umbigo do que com estas questões britânicas.
Vamos tocar num assunto, talvez pela primeira vez no Brasil, no intuito duplo de
despertar os maçons brasileiros sobre as questões de alta política e deixar
um pouco a nossa mania de tratar de assuntos supersticiosos e irrelevantes que
povoam o nosso imaginário maçônico. II – Primórdios: Wharton
O Clube do Fogo do Inferno foi fundado ali pelo ano de 1719 pelo
controverso Philip, Duque de Wharton (1698-1731), um aristocrata, um proeminente
político Whig e maçom emérito, pois foi o sexto Grão-Mestre da Grande Loja
de Londres na molecagem dos seus 22 anos. O Duque de Wharton oscilava, nos primórdios
de sua vida, entre um ateísmo que ridiculariza a religião, passando por uma
fase deísta na maçonaria e morrendo aos 33 anos, convertido ao catolicismo,
num convento franciscano na Espanha. Na sua juventude, presidia reuniões
festivas com vestes satânicas numa taverna perto da praça St. James em
Londres.
Outro distinto integrante do Clube era Lady Mary Wortley Montagu, mulher
do Embaixador Edward Wortley Montagu, de notável personalidade e inteligência
e, além do mais, amante de Wharton. Viajou longamente pela Europa continental,
quase sempre desacompanhada do marido, e corria a lenda que teria se infiltrado
no harém do Sultão em Constantinopla no intuito de descobrir o segredo da
vacina contra a varíola.
Outro ingrediente da trama que iremos viver, foi o escândalo e a
derrocada na bolsa de valores das ações da Cia. Mares do Sul (South Sea Co.),
em 1720, que levou a quebra dos especuladores, entre eles, os nossos Wharton e
James Anderson. Como se sabe, a Cia. foi fundada em 1711 para comercializar com
a América Espanhola, principalmente no tráfico de escravos. Tudo estava
baseado na Guerra da Sucessão Espanhola, pois a cia. esperava lucrar com a
guer-ra civil na Espanha, na esperança de conseguir um tratado que permitisse o
tráfico de escravos. O Tratado de Paz de Utrecht, contudo, firmado em 1713, foi
menos favorável do que o esperado, impondo uma taxa anual aos escravos
importados e permitindo à cia. enviar somente um navio a cada ano para o tráfico.
O sucesso da primeira viagem, entretanto, em 1717 foi bastan-te moderado, mas
quando o rei Jorge I - reinou de 1714 a 1727 - tornou-se o presidente da cia.,
em 1718, criou-se uma confiança tão grande que as ações da cia. começaram a
entrar em alta. Além do mais, o Parlamento aprovou uma lei (South Sea Bill),
uma duvidosa peça legislativa que permitia à cia. assumir todo o débito
nacional para pagá-lo com seus lucros. Esta privatização avant
la lettre resultou num boom no mercado de ações. Todo mundo queria
freneticamente comprar suas ações e a bolha estourou em 1720, levando de roldão
não só as ações da cia. como de todo o mercado. Quando os investidores
quebraram, como vimos acima, o Parlamento criou uma comissão de inquérito,
demonstrando cabalmente que, pelo menos, três ministros foram corrompidos e
mergulharam, também, na especulação. Tal fato foi crucial na subida ao poder
de Robert Walpole, que conseguiu salvar o ministério Whig da derrocada.
Wharton sempre se opôs a este esquema de suporte político desde o começo.
Liderava uma coalizão confusa de Whigs e Tories contra o primeiro-ministro
Suderland e Robert Walpole. Aqui convém esclarecer que a política britânica
do século XVIII era dominada pelo par-tido Whig e pelo partido Tory, cuja fundação
tinha sido estabelecida no século precedente, mas que, só se tornaram
partidos, no sentido moderno do termo, em 1784. As expressões Whig e Tory são
palavras gaélicas cuja tradução seria “ladrão de cavalos” e
“foras-da-lei” que eram aplicadas pelos partidários aos membros do campo
oposto. Os Tories eram basicamente conservadores, opunham-se à tolerância
religiosa e frequentemente esposavam a crença no direito divino dos reis.
Compunham-se de membros da alta hierarquia da igreja anglicana e da nobreza de
província. Os Whigs eram, nesta época, o partido majoritário, composto de
aristocratas latifundiários e da poderosa burguesia nascente. Eram partidários
de uma monarquia constitucional, do imperialismo inglês no exterior e do
liberalismo laissez faire.
A maioria Whig, quando se sentiu pressionada pela coalizão de Wharton,
partiu para o contra-ataque. Para desviar a atenção pública do escândalo da
Bolha dos Mares do Sul (South Sea Bubble) e minar a credibilidade política de
Wharton, Suderland e Walpole denunciaram, perante o Parlamento, as atividades de
Wharton no Clube do Fogo Inferno. Estas acusações de imoralidade alienou o
apoio dos Tories conservadores e dos Whigs liberais e o poder de Wharton foi
quebrado.
O Clube foi destroçado e daí a tentativa desesperada de Wharton em se
tornar Grão-Mestre da Grande Loja de Londres em 1722. Parte da descrição do
evento se encontra nas edições de 1723 e de 1738 das nossas Constituições de
James Anderson. Na primeira edição, que imortalizou Wharton, pois é citados
diversas vezes, Anderson tece tanto loas a Wharton quanto ao duque de Montangu.
Na segunda - de 1738 – Anderson começa a apagar a imagem do doidivanas,
inclusive tecendo algumas críticas, pois os jacobitas estavam se tornando carta
fora do baralho na política britânica. Wharton foi execrado por diversas razões:
i) pela sua imaturidade; ii) pelo seu libertinismo e iii) por ser jacobita, ou
seja, partidário de Jaime (Jacobus em latim) II, rei católico da dinastia
Stuart deposto em 1688, numa época em que a dinastia protes-tante alemã de
Hanover buscava se firmar no trono inglês. Dizem as más línguas que quando da
cerimônia de instalação na Grande Loja, a orquestra tocou um hino jacobita:
“Let the King Enjoy His Own Again”.
Desnecessário dizer que o duque de Montagu, antecessor de Wharton no Grão-Mestrado
era afilhado do rei Jorge I. Wharton termina seus últimos anos de vida
via-jando para Viena, tentando persuadir os austríacos habsburgos a invadir a
Inglaterra para reen-tronizar os Stuarts, na volta passa por Roma e termina os
seus dias, na maior penúria, num mosteiro franciscano em Madri, após fundar a
primeira loja maçônica na Espanha. III – A Segunda Geração: Dashwood
A segunda fase do Clube do Fogo do Inferno tem como seu expoente máximo
Sir Francis Dashwood que nasceu em 1708 e era proveniente de uma linhagem de
ricos mercadores ‘turcos’ - ou seja, comerciantes que desde o século XVII
mercadejavam com o Império Otomano - que se infiltraram na nobreza inglesa por
meio de casamentos, dinheiro e política.
Dashwood possuía uma personalidade complicada. Sua mão faleceu quando
tinha dois anos, educou-se em Eton e quando seu pai expirou em 1724, trancou-se
numa cela durante uma semana para embebedar-se. Em 1726, cansado do frio inglês,
começou um turismo pelos mares mais tépidos do Mediterrâneo, onde o bom vinho
borbulhava e as mulheres eram mais quentes. Em Florença manteve contato com o
abade Nicolini, maçom, católico jacobita, parti-cipando da loja inglesa
naquela cidade, tanto assim que, quando o conde de Middlesex tornou-se venerável
desta loja alguns anos mais tarde, uma medalha foi cunhada sobre o evento.
Apresentava o deus egípcio Harpócrates (o deus Horus quando criança),
simbolizando o nascimento do eon, ou seja, uma criança com o dedo sobre os lábios, exortando ao
silêncio. Dashwood com o tempo, tornou-se um apreciador das artes e da
arquitetura clássicas e ao retornar à Inglaterra fundou a Sociedade dos
Diletantes. Este grupo discutia os clássicos em jantares opíparos regados a
vinho de qualidade, encorajando o estilo Paladiano de arquitetura na Inglaterra
e chegou mesmo a promover uma expedição à Ásia Menor. Coincidência ou não,
Carlos, o conde de Middlesex, era o filho mais novo de Lionel Sackville, duque
de Dorset, amigo íntimo de Wharton.
Ao retornar à Inglaterra não permaneceu por muito tempo pois, após
fundar a Sociedade, partiu com Lorde Forbes para São Petersburgo, onde dizem,
seduziu a Imperatriz Ana disfarçado de Rei Carlos XII da Suécia que estava
morto nesta época. Em 1730, vamos encontrá-lo viajando através da Grécia com
John Montagu, conde de Sandwich, em busca de ques-tões esotéricas do Oriente.
Fundaram, então, o Clube Divã, dedicado a imitar o modo de vida turco. Em
1739, já quase no final de sua longa viagem, parou em Florença para visitar o
abade Nicolini e onde encontrou a antiga amante de Wharton – Lady Mary Wortley
Montagu – que se integrou ao Clube do Divã e, a tradição afirma, que acabou
prestando votos na futura Aba-dia de Medmenham, com iremos ver.
As coisas não estavam indo bem para a maçonaria na Itália, pois em
1738 o papa Clemente XII promulgou uma bula – In
Eminenti Apostolatus Specula – proibindo os católicos, sob pena de
excomunhão, de pertencer à maçonaria. Convém salientar que, nos Estados
Papais, pertencer à uma loja era passível de pena de morte e nos Estados não-papais,
dava-se, livre curso para que a inquisição tomasse as providências necessárias
contra as lojas. Em 1740, o papa estava morto e Dashwood encontrava-se em Roma
para assistir ao conclave que elegeria o novo papa. Lá assumiu a identidade do
Cardeal Ottiboni, um dos maiores perseguidores dos maçons, e o satirizou
publicamente num indecente ritual de zombaria.
Dashwood aprontou coisas mais graves que acabaram por estabelecer sua
infame reputação. Na Sexta-feira Santa era costume da época que os penitentes
se auto-flagelassem defronte a Capela Sistina. Inspirado ou não, seja pelo
eroticismo da cena ou furioso pela perseguição infligida aos maçons,
Dashwood, excitado pelo vinho, meteu-se a açoitar os fiéis com o seu chicote
do cavalo. A tradição afirma, sem muitas provas, que este incidente levou a
uma conversão passageira de Dashwood que, após o incidente, bêbado, foi
dormir nos seus alojamentos. Teria sido acordado altas horas da noite por gritos
agudos inumanos e ficou estarrecido ao se deparar com quatro incandescentes
olhos verdes observando-o através da janela. Convencido de que tinha sido
visitado pelo demônio, arrependeu-se de seu comportamento sacrílego na
Sexta-feira Santa e converteu-se ao catolicismo. Daquele momento em diante,
assistiu à missa regularmente e era visto constantemente portanto um rosário.
Este comportamento inusitado durou até o momento que seu companheiro de viagem
revelou que também tinha visto a aparição e tudo não passava de um par de
gatos, no cio, copulando. A desconversão de Dashwood foi imediata e galvanizou
ainda mais o seu anti-catolicismo e contribuiu para o seu tão afamado
satanismo.
Se esta história pode ser lenda, o apoio de Dashwood à causa jacobita não
pode ser colocado em dúvida. Teria entrado em contato com o príncipe Charles
Edward Stuart, pretendente do trono inglês que nessa época residia em Roma. A
conspiração de Dashwood só não progrediu por que faltou a uma reunião com o
tutor do príncipe, o nosso maçom e católico: Cavaleiro André Ramsay.
Existia, naquela época, uma lenda que muito impressionou a Dash-wood: o Jovem
Pretendente ao trono inglês – o Bom Príncipe Charles – seria o Cavaleiro
da Pena Vermelha, o “superior desconhecido” da Ordem Maçônica do Templo.
Esta lenda era fruto das histórias da carochinha de Ramsay que dizia ser a
ordem maçônica descendentes dos Cavaleiros Templários e a Casa de Stuart, seu
último legítimo descendente.
Dashwood finalmente retornou à Inglaterra em 1741 e seu tio – o conde
de Westmore-land – tentou persuadi-lo a entrar na política. Naquele momento,
o eleitorado encolhia (o bairro de Old Sarum tinha um eleitor e contava com dois
assentos no Parlamento) e a corrupção (a compra de votos era artigo
corriqueiro) grassava nos arraiais políticos. Walpole, finalmente, nomeado
primeiro-ministro pelo rei Jorge
II, que sucedeu seu pai em 1727, dominou o escân-dalo do South Sea com firmeza
e suborno, alçando-se a uma posição impar na política inglesa. O rei
reinava, feliz, por conseguir financiar os seus exércitos alemães com taxas
inglesas, um dos fatores que favoreceu à Guerra dos Sete Anos (1756-63). IV – O Club do Fogo do Inferno
A tradição assegura que o Clube do Fogo do Inferno de Dashwood se
reunia original-mente em Londres na Taverna “Jorge e o Abutre”. Dizia-se que
Dashwood e seus epígonos encontravam-se em locais públicos para usufruir da
Lei contra a Bruxaria, que tinha sido repe-lida pelo Parlamento em 1736,
ressuscitando o Clube do Fogo do Inferno de Wharton dentro de um espírito de
deboche. É notório que no início do século XVIII, as tavernas eram os
lo-cais onde as lojas se reuniam, pois inexistiam, ainda, os templos maçônicos.
É pois, bem provável, que o renascente Clube fosse, também, um pretexto para
que os partidários jacobitas pudessem reunir-se sem apresentar muitas
suspeitas.
Em 1750, Dashwood alugou a Abadia de Medmenham e começou uma restauração
sui generis no ano seguinte. A Abadia
era originária do século XIII e tinha sido expandida no período Tudor.
Dashwood acrescentou uma torre em ruínas e um claustro para dar um charme de
atmosfera gótica, tão apreciado pelo satanistas, ao edifício. No frontão da
entrada, colocou o dístico famoso de François Rabelais: “Fay
ce que voudras” (Faça o que você quer). Esta frase foi cunhada por
Rabelais quando descreve a Abadia de Thélème no seu clássico Gargantua e
Pantagruel. Curioso é que duzentos anos depois, o ‘satânico’ Aleister
Crowley e seu pessoal da OTO iriam usar o mesmo dístico.
Comentava-se que a biblioteca da abadia continha invejáveis coleções
de erótica, uma Bíblia em latim publicada em 1714, uma hagiografia e uma cópia
da Conjectura Cabalística. As paredes estavam decoradas com retratos de reis
ingleses (o retrato de Henrique VIII com pedaços de papel colados no lugar dos
olhos); o deus Harpócrates, dedos nos lábios, pairava sobre o refeitório. A
sala do Capítulo era o local estratégico para entender as atividades dos
mon-ges. Seus móveis ficaram desconhecidos para a posteridade, perdendo-se nas
brumas do mistério. Autores mais sensacionalistas juravam ser um santuário
para rituais satânicos, hoje, supõem-se mais razoavelmente que eram usados
para cerimônias maçônicas.
John Wilkes (1725-1797), um jornalista e político populista inglês,
membro do Parlamento, xerife e prefeito de Londres, foi iniciado, elevado e
exaltado maçom em 1769 na prisão de King’s Bench, fato que o tornou célebre
na comunidade maçônica, pois era expressamente proibido iniciar um maçom que
estivesse preso ou confinado numa prisão, visto que, para ser iniciado, o
candidato deve “ser livre”. Wilkes, outra personalidade controversa,
participou de diversas lojas maçônicas, tanto dos modernos como dos antigos,
além de inúmeras sociedades dos mais diversos feitios, foi, também, na sua
juventude, fundador e participante da Abadia de Medmenham. Wilkes, muitas vezes
criticado como oportunista, contribui, na sua época, para consolidar o direito
da liberdade de imprensa, forçou a Inglaterra a reexaminar suas regras so-bre o
sufrágio e inspirou os colonos norte-americanos na sua demanda por liberdade.
Quando Wilkes rompe com o Clube do Fogo do Inferno, difamou-o num artigo com as
seguintes palavras: “Nenhum olho profano jamais ousou penetrar nos mistérios
dos Elêusis ingleses na sala do Capítulo, onde os monges reunidos em solenes
ocasiões, praticavam os mais secretos ritos e libações eram oferecidas, com
muita pompa, à BOA DEUSA (BONA DEA)”. Alguns autores interpretavam esta menção
de BOA DEUSA como significando que eles praticavam ritos druídicos. Horácio,
filho de Walpole, inimigo político de Dashwood, ironizava-os da seguinte
maneira: “Fosse qual fosse a sua doutrina, o rito que praticavam era
rigorosamente pagão: Baco e Vênus eram as deidades a quem eles publicamente
sacrificavam”. A única vista que os profa-nos tinham da atividade da Abadia
era a de ver os monges passeando de bote sobre o Tâmisa. Os membros mais
famosos do grupo eram: o irmão de Dashwood, John Dashwood-King; John Montagu,
conde de Sandwich; John Wilkes; George Bubb Dodington, barão de Melcombe; Paul
Whitehead e outros membros menos nobres e profissionais liberais.
As lendas da época falam de escândalos, orgias sexuais sado-masoquistas
que ocorriam no interior da Abadia.
O Clube não possuía uma agenda política única. Embora a maioria de
seus membros fosse Whig, o conde de Sandwich, que se tornou Primeiro Lorde do
Almirantado, tinha claras inclinações Tories e John Wilkes, como vimos, era um
populista inveterado. O certo é que devido ao mote de Rabelais – faça o que
você quer – eles compartilhavam um ponto de vista comum na capacidade humana
de se auto-governar sem necessidade de um corpo de lei im-posto de fora.
Dashwood, por exemplo, era politicamente independente, acreditando ser mais
importante votar de acordo com sua consciência do que seguindo diretrizes
partidárias. Durante sua longa e controversa carreira, teve assento nas duas
Casas do Parlamento, foi Ministro da Fazenda e diretor-geral dos Correios.
Propugnava pela formação de uma milícia nacional visando abolir o exército e
as tropas alemãs mercenários, em suma, desejava minar o poder real. Dashwood
logrou entrar no círculo do príncipe herdeiro Frederick, um maçom, iniciado
por Desaguliers em 1737, filho de Jorge II, que atraía muitos jacobitas entre
os seus acólitos. Che-gou, mesmo, a ser confidente do Príncipe Fritz, mas
caiu, de novo, em desgraça com o morte do príncipe em 1751.
Quando o Gracioso Príncipe Carlos (Bonnie Prince Charles), o último
stuart a reivindicar o trono inglês, embarcou, na sua tentativa frustrada de
invadir a Inglaterra com apoio franco-escocês em 1744, a Casa dos Comuns foi
tomada de um frenesi patriótico. Votaram, então, um ato de lealdade a Jorge
II. Dashwood, ao tentar postular uma emenda a este ato no sentido de alertar o
soberano a não-infringir a liberdade de seus súditos, foi apodado de jacobista
inve-terado.
Outra curiosidade de Dashwood foi sua amizade com Benjamin Franklin. Em
1770, produziram um plano de reconciliação entre os britânicos e suas colônias
rebeldes na América do Norte. Ignorou-se o plano, e as conseqüências todos nós
conhecemos. Em 1773, revisaram o Livro de Preces (Book of Common Prayer) –
livro de orações da Igreja Anglicana – o que, convenhamos, é uma atividade
pouco comum para um satanista. Alguns historiadores especulam que os dois
pretendiam, com isso, tentar trazer a Igreja Anglicana para o deísmo maçônico.
As mudanças eram no sentido de remover todas as referências ao Antigo
Testamento, eliminar as múltiplas repetições de que era prenhe o Livro de Orações
e trazer a Igreja Anglicana para uma postura mais ligada à comunidade e menos
portentosa. Esta liturgia ainda é utilizada por diversas seitas protestantes
nos EEUU. V – Conclusão
Pode-se adotar a crença popular de que Dashwood era um satanista e ponto
final. Uma interpretação mais sofisticada, especularia sobre os rumores de
magia sexual, o livro de cabala da Abadia, a imagem de Harpócrates, as ligações
de Dashwood com a Ordem Maçônica do Templo e o lema da Abadia de Thélème –
Faça o que você quer – na Abadia de Medmenham, levaria-nos a concluir que o
Clube do Fogo do Inferno era uma manifestação avant la lettre de uma sociedade
satânica à la Aleister Crowley.
A nossa interpretação é a de que, tirante as manifestações pour
épater le bourgeois de uma espécie de um Clube dos Cafajestes de um bando
de aristocratas ingleses, a Abadia devia conter o Capítulo de um templo maçônico,
albergando envolvidos numa conspiração de jacobitas para recolocar os Stuarts
no trono da Inglaterra.
Daniel Willens conclui também que muitos dos associados maçônicos de
Dashwood eram católicos jacobitas. Dashwood provinha de uma burguesia recém
nobilitada, faltando-lhe uma linhagem mais aristocrática. O glamour
cavaleiresco das ordens ‘templárias’ jacobitas era um atrativo capitoso
para pequena nobreza e os jesuítas sabiam explorar isto muito bem. Lembremo-nos
do Cavaleiro Ramsey. A “conversão” de Dashwood em Roma, que foi
posterior-mente tão ridicularizada, não teria sido uma conversão verdadeira?
É bom recordar que os católicos não podiam exercer emprego público na
Inglaterra no final do século XVIII. As paródias ridículas dos sacramentos,
as “Missas Negras”, não seriam na verdade missas católicas, impossíveis
de serem realizadas numa Inglaterra fundamentalisticamente protestante? Desde
que Henrique VIII cortou os vínculos com Roma, o catolicismo foi
‘demonologizado’ na In-glaterra. Os monges satânicos eram figuras
extremamente populares nos ‘romances góticos’ da época. Na perspectiva
britânica da época, tudo que fosse papista devia ser satânico.
A Bíblia em latim, a hagiografia, o retrato deformado de Henrique VIII,
as evasivas no Livro de Preces, não seria por isso, conclui finalmente Willens,
que Sir Francis Dashwood, o notório satanista, seria de fato um maçom jacobita
e, ainda por cima, católico? Bibliografia BAIGENT,
Michael e LEIGH, Richard, Des Templiers
aux Franc-Maçons: la Transmis-sion du Mystère, Editions du Rocher, France,
1991. CHURCHILL, Winston S., A History
of the English Speaking People, iv vols., Barnes & Nobles Book, New
York, 1993. ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 30 vols., University of Chicago, USA, 1982. KEMP, Betty, Sir Francis Dashwood:
Na Eighteenth Century Independent, St. Martin’s Press, New York, 1967. McCORMICK, D., The Hell Fire Club,
Londres, 1958. MANNIX, Daniel P., The Hell-Fire
Club, Ballantine Books, New York, 1959. ROBINSON, John J., Born in Blood:
the Lost Secret of Freemasonry, M. Evans & Co., New York, 1989. SUMMERS, Montague, Witchcraft and
Black Magic, Rider & Co., London, 1946. TOWERS, Eric, Dashwood: The Man
and the Myth, The Aquarian Press, Wellingborough, Northamptonshire, 1986 WILLENS, Daniel, The Hell-Fire Club: Sex, Politics, and Religion in Eighteenth-Century England, Gnosis, 1992, INTERNET. |